Título: Missionária despertou amor e ódio, na mesma intensidade
Autor: Leonêncio Nossa
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2005, Nacional, p. A5
"DOTI": Poucos foram tão odiados ou amados com tanta intensidade nas matas e trilhas do oeste do Pará. A missionária americana Dorothy Stang era vista como demônio pelos madeireiros e idolatrada como um anjo por uma legião de seguidores, em sua maioria ex-trabalhadores de Serra Pelada, maior garimpo a céu aberto do mundo, que reuniu mais de 80 mil miseráveis, nos anos 80. "Nem na serra, onde me arrebentei todo, tive uma pancada maior que essa", diz o colono Raimundo Nonato dos Santos, numa referência à morte da religiosa. Vestindo uma camisa com a inscrição Movimento Pró-Sobra do Ouro, Santos diz ter desistido de esperar a prometida indenização do governo pelo trabalho em Serra Pelada. Ele vive há dois meses no assentamento criado pela missionária, a 40 km do centro de Anapu. "Quando acabou o garimpo, a gente voltou para casa sem emprego, sem nada", conta. "Aqui ela dava as ordens: 'Meu povo vamos plantar a mandioca, o cacau, criar galinha e um pouquinho de gado. Mas não quero que explore a mata toda para crescer capim." A Transamazônica do Plano de Desenvolvimento Sustentável 51, o assentamento montado por Dorothy, é uma estrada onde só é possível trafegar com carros de grande potência. Ela costumava ir de caminhão ou caminhonete para conversar com seu "exército", cerca de 300 famílias. "Se alguém tiver de ir para o céu, vai a irmã Doti", diz o ex-garimpeiro Jonas Pereira da Silva.