Título: Lula diz que achou corrupção no governo FHC, mas ordenou silêncio
Autor: Wilson Tosta
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/02/2005, Nacional, p. A8

Em uma estocada no PSDB, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem ter impedido, no início de seu governo, a divulgação de supostos casos de corrupção envolvendo privatizações de empresas ocorridas no governo de seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Sem citar nomes nem detalhes, Lula, em discurso após visitar uma unidade da Petrobrás no norte do Espírito Santo, disse que ordenou silêncio a respeito do caso por considerar que não é possível que o País se desenvolva se seus políticos ficarem "se lamentando e chorando". O presidente afirmou também que a divulgação do caso seria boa se tivesse decidido "achincalhar" a administração passada, mas não foi essa a sua atitude. "Tivemos um momento logo no início do governo, quando um alto companheiro meu, numa função muito grande, veio prestar contas de como tinha encontrado a instituição em que estava trabalhando - me permitam aqui não dizer qual instituição", afirmou. "E ele me dizia simplesmente o seguinte: 'Presidente, a nossa instituição está quebrada. Estamos falidos. O processo de corrupção que aconteceu antes de nós foi muito grande. Algumas privatizações que foram feitas em tais lugares levaram a instituição a uma quebradeira.' Eu disse ao meu companheiro: "Olha, se tudo isso que você está me dizendo é verdade, você só tem o direito de dizer para mim. Aí para fora, você fecha a boca e diga que a nossa instituição está preparada para ajudar no desenvolvimento do País.'"

Lula contou que o "companheiro" não entendeu a ordem e relatou o que lhe disse na ocasião. "É isso mesmo. Porque nós em três dias de posse, com três meses de posse, saímos pelo Brasil vendendo a idéia de que determinadas coisas importantes em que a sociedade brasileira acredita, que determinadas instituições de que a República tanto necessita como uma espécie de alavanca para o desenvolvimento deste país, e a gente sai dizendo que ele está quebrado? Eu me pergunto: que mensagem vamos passar para a sociedade, tanto a sociedade interna como a sociedade externa?"

O presidente disse que tomou uma decisão "muito pessoal", que transformou em determinação de governo, de não responsabilizar o governo passado pelos problemas que encontrou. "Quando a gente casa com uma viúva, a gente não recusa a família, a gente casa com a viúva, com os filhos, com a mãe, com o pai e com as virtudes e os defeitos que as pessoas possam ter", ironizou.

O discurso foi feito depois da visita de Lula às obras da Estação de Tratamento de Óleo da Fazenda Alegre, maior campo da Petrobrás no norte capixaba, em Jaguaré. Ele estava com o presidente da empresa, José Eduardo Dutra, a ministra das Minas e Energia, Dilma Rousseff, o governador Paulo Hartung (sem partido) e o prefeito interino da cidade, Rogério Feitane. Também o acompanhavam os senadores Gerson Camata (PMDB) e Francisco Pereira (PL), prefeitos e deputados estaduais e federais do Estado.

OTIMISMO

Na chegada, ele surpreendeu os seguranças ao usar uma entrada não prevista para ir até a unidade da Petrobrás. No pronunciamento, Lula disse que às vezes fica "meio cauteloso, para não parecer otimista demais", mas admitiu: "Sou o maior vendedor de otimismo que este país já pôde produzir. Primeiro, porque acredito em cada gesto que se faça por este país; segundo, porque acredito que o Brasil está tendo uma oportunidade histórica, que há muitos e muitos anos o Brasil não teve. As que teve jogou fora."

Como chances que o País teria perdido, citou o Plano Cruzado, em 1986, que "acabou depois das eleições", e o Real, que "acabou quando se aprovou a tese da reeleição" - outro ataque aos tucanos. "Tudo isso porque um político tem de pensar grande", disse. "E pensar grande não permite que um político pense em si mesmo, pense apenas no seu mandato. Pensar grande obriga o político a pensar o País para daqui a 30 anos, a 40 anos, a 20 anos. É pensar nas futuras gerações e não pensar apenas nas futuras eleições, como habitualmente acontece."

Ele reafirmou que os três grandes projetos de seu governo serão o Programa de Biodiesel, a transposição do Rio São Francisco e a Ferrovia Transnordestina, todos no Nordeste. "O Estado não é nada mais que uma mãe", afirmou. "Mas não uma mãe que faz proselitismo. Uma mãe que se tiver dois filhos vai sempre dar mais atenção para o que está mais fraquinho, mais frágil. Eu acho que o Nordeste precisa de uma oportunidade que outros Estados tiveram durante todo o século 20." Lula disse que muita gente prefere que os investimentos sejam feitos na parte mais rica do País.

O presidente também pegou "carona" no discurso de Hartung, que o precedeu e disse que no Espírito Santo Lula não encontraria "buttonzinhos com os dizeres o gás é nosso", numa alusão à campanha do governo do Rio para exigir uma refinaria no norte do Estado, que usa o lema "O petróleo é nosso e a refinaria também". O governador disse ainda que o gás extraído em território capixaba "é do Brasil". Lula respondeu que "o petróleo, na verdade, é de 180 milhões de brasileiros."