Título: BC indica fim do ciclo de alta do juro
Autor: Sheila D'Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2005, Economia, p. B1

O Banco Central (BC) baixou o tom de suas preocupações com a resistência da inflação e começou a preparar o terreno para interromper o processo de alta nos juros. Mesmo assim, a taxa Selic ainda deverá subir um pouco e permanecer alta por um longo período, para garantir que a inflação ficará próxima da meta fixada para este ano, que é de 5,1%. Essa é a principal mensagem da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem. O texto foi considerado "bonzinho" pelos analistas de mercado, em contraste com os meses anteriores, em que foi classificado como "malvado". A transição de uma ata "malvada" para uma "boazinha" foi motivo de muita apreensão no BC antes de divulgar o documento. Os diretores precisavam desarmar o estado de alerta no mercado financeiro depois do cenário traçado nas reuniões anteriores do Copom, mas não queriam criar um clima muito otimista. O texto divulgado, segundo fontes ligadas ao assunto, foi exaustivamente debatido na cúpula do BC para tentar pontuar muito bem como a autoridade monetária está vendo o ritmo de convergência da inflação para a trajetória desejada. No caso da ata de janeiro, quando o BC elevou o tom das preocupações com o nível de preços e enterrou a possibilidade de os juros caírem no primeiro semestre deste ano, houve ainda um componente político. As críticas à atuação do BC somaram-se a boatos de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria ficado irritado com o presidente do BC, Henrique Meirelles, por causa da decisão. Aquele momento, de acordo com interlocutores do governo, requeria um posicionamento "mais duro" da autoridade monetária em relação às suas decisões. Esse episódio já é tido como superado. E o foco da ata deste mês ficou com a convergência dos preços para o nível desejado pelo governo. O IPCA ainda é considerado elevado, apesar do ligeiro recuo no mês passado. O modelo utilizado pelo BC mostrou, inclusive, que mesmo após o aumento de 0,5 ponto porcentual na taxa de juros anunciado em janeiro e a valorização do real em relação ao dólar, a inflação projetada para o ano não recuou e "permaneceu estável, com pequena queda na margem". Isso só reforçou a necessidade de uma nova alta dos juros e também fez com que o Copom discutisse a idéia de promover, até mesmo, uma alta maior. Os diretores acreditam que agora o risco de interrupção de queda da inflação foi reduzido e, assim, o ajuste nos juros pode retomar o "ritmo originalmente previsto". Com o aumento deste mês, os juros já se aproximam do nível que, segundo o Copom, fará com que a inflação convirja para a meta de 5,1% estabelecida para este ano. Mas isso não quer dizer que a alta da Selic foi encerrada. Os diretores dedicam boa parte do documento a rebater avaliações de que há um descasamento entre as políticas fiscal e monetária. No entanto, eles admitem que os gastos públicos têm sido mais importantes para a alta da inflação do que o consumo. E reconhecem que medidas para estimular o mercado de crédito, como os empréstimos com desconto em folha, estariam atuando na direção contrária à pretendida com a alta da Selic. Eles acham, porém, que nenhum desses fatores invalida a política monetária. No caso das medidas de estímulo ao crédito, alegam, elas contribuirão para melhorar a intermediação financeira e, no médio prazo, poderão até mesmo reforçar a política monetária. Já com relação aos cortes dos gastos públicos, eles acreditam ser inegável que eles "reforçam a ação da política monetária no controle da inflação e o aprofundamento no processo de melhora nas contas públicas abre ainda mais espaço para redução das taxas de juros reais da economia no médio prazo". Mas garantem que isso não quer dizer que o nível atual das despesas do governo reduz o efeito da alta dos juros na economia.