Título: Tropas ficarão no Pará até o fim do ano
Autor: Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/02/2005, Nacional, p. A5

O governo federal assegurou ontem a um grupo de sindicalistas e representantes dos movimentos sociais do Pará a permanência das tropas do Exército e de equipes da Polícia Federal até o fim deste ano na região onde os conflitos agrários cresceram nas últimas semanas e a missionária Dorothy Stang foi assassinada. Também prometeu que o Exército e a PF vão fazer a segurança dos líderes ameaçados de morte e promover uma operação de desarmamento na região. "Recebemos garantia de que o Exército ficará na região até o fim do ano para garantir o andamento das ações federais", disse o deputado José Geraldo (PT-PA), que participou da reunião de mais de 4 horas com representantes dos Ministérios do Desenvolvimento Agrário, do Meio Ambiente e da Justiça, da Secretaria de Direitos Humanos e do Gabinete de Segurança Institucional. As 17 organizações apresentaram pauta de 68 itens, começando pelo imediato ordenamento fundiário no Pará. "Os ministros nos garantiram esforços para estruturar a presença dos órgãos federais na região e também recursos suplementares para as estradas Cuiabá-Santarém e Transamazônica", disse José Geraldo.

O grupo também pediu a federalização da investigação sobre o assassinato da irmã Dorothy e de outros seis líderes na região. "Não há por que ficarmos reféns da Polícia Civil quando sabemos que não estão fazendo um trabalho correto", explicou o deputado. Os sindicalistas vão cobrar do governo a proteção prometida, mas não querem ser retirados da região. O grupo apresentou à Secretaria de Direitos Humanos uma lista de pessoas que sofrem ameaças de morte.

BILHETE

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Anapu, Francisco de Assis de Souza, um dos participantes da reunião, recebeu duas ameaças de morte nos últimos 10 dias. A última na madrugada de ontem. Chiquinho, como é conhecido, era amigo da freira desde os 12 anos. Na primeira ameaça, um bilhete, o recado foi claro: "Dorothy já morreu. Você é o próximo." Ontem, Chiquinho chegou a Brasília sob proteção do PT, ao qual é filiado, para a reunião.

Rayfran Sales, um dos acusados de matar Dorothy, chegou a apontá-lo como mandante do crime em seu primeiro depoimento, à Polícia Civil. Em seguida, ao depor à Polícia Federal, Rayfran desmentiu a informação, dizendo que combinara acusar o sindicalista para despistar a polícia. "Esse é o maior de todos os absurdos. Essas pessoas estão brincando com o poder constituído do Estado, com as investigações. É uma forma de embaralhar o foco das investigações", disse Chiquinho ontem.

Na madrugada de ontem, sua família recebeu a segunda ameaça. Na madrugada, dois homens abriram a janela de um quarto da casa de seu pai e tentaram seqüestrar sua prima Carina, de 17 anos, para que os levasse onde Chiquinho estaria. A menina gritou, atraindo a atenção das demais pessoas da casa, e os homens fugiram. "A denúncia foi feita à polícia, pedimos proteção, mas até hoje de manhã nenhum policial tinha ido até a casa de meu pai", contou ele.

No dia 14, homens entraram na casa do pai de Chiquinho enquanto os moradores de Anapu esperavam no aeroporto o corpo de Dorothy para fazer o cortejo até o cemitério. Só Carina estava em casa. "Os homens entraram, exigiram que ela servisse comida e a obrigaram a escrever um bilhete para mim", conta. Nele, a ameaça: "Dorothy já morreu. Você é o próximo. Vocês pensam que são inteligentes, mas somos muito mais espertos. Isso não é uma ameaça, é apenas um aviso. Te cuida."