Título: STF derruba cotas em faculdade estadual de SP
Autor: Simone Iwasso
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/02/2005, Vida &, p. A12
O ministro Nelson Jobim, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), cassou a liminar que obrigava a Faculdade de Medicina de Marília (Famema), uma instituição pública e gratuita, ligada ao governo do Estado de São Paulo, a destinar 30% de suas vagas para um sistema de cotas. A decisão entrou em vigor na última sexta-feira e fez com que a faculdade cancelasse as matrículas dos alunos cotistas, chamando para as vagas os candidatos que tiveram melhor desempenho e estavam na lista de espera, de acordo com o processo normal de seleção, organizado pelo vestibular unificado da PUC-SP. Pela liminar, concedida pela Justiça de Marília no segundo semestre do ano passado, após uma ação movida pelo Ministério Público, as vagas deveriam ser preenchidas por alunos vindos de escolas públicas e com renda familiar per capita de até um salário mínimo. Das 80 vagas para o curso de Medicina e das 40 para o de Enfermagem, 30% (ou 36, no total) deveriam ser reservadas.
Com o respaldo da Procuradoria-Geral do Estado, a faculdade entrou com uma ação contra a liminar no Tribunal de Justiça. O pedido foi negado e a instituição recorreu ao STF, argumentando que a liminar a obrigava a adotar uma política pública educacional que não está prevista na lei e que o Judiciário tinha interferido em uma questão de responsabilidade do Legislativo. A ação foi aceita pelo ministro Nelson Jobim e não há recurso para o caso.
"A faculdade não se recusa a discutir o problema, mas é uma questão que precisa ser melhor pensada por todos os interessados. Sabemos que esses alunos carentes estudam com dificuldade, precisam trabalhar. Mas obrigar a faculdade a adotar o sistema de cotas não resolve o problema", diz o diretor da instituição, César Emile Baaklini. De acordo com ele, as cotas como foram colocadas pelo Ministério Público prejudicariam a faculdade.
Ele cita, por exemplo, que o melhor aluno que preencheu os requisitos necessários para as cotas ficou em 2.800.º lugar no vestibular unificado da PUC-SP. Uma distorção, segundo Baaklini, já que o aluno que ficou em 80.º não conseguiria a vaga se a liminar estivesse valendo. "Os aprovados na Faculdade de Medicina de Marília geralmente ficam entre os 100 ou 150 melhores do vestibular."
A liminar da Justiça de Marília foi até agora a única no País a obrigar a adoção das cotas em uma instituição. Todas os sistemas existentes foram adotados por iniciativa das próprias universidades, como a Universidade de Brasília (Unb) e a estadual do Rio (UERJ). No Estado, neste ano a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) foi a primeira a adotar o sistema, criando 10% a mais de vagas.
PARANÁ
A Universidade Federal do Paraná (UFPR) terá este ano 521 estudantes beneficiados pelas cotas destinadas a pessoas negras e outros 875 que conseguiram provar terem estudado em escolas públicas. Na listagem definitiva, estão os nomes de 70 dos 122 cotistas negros que tiveram que provar que são afrodescendentes. A lista deveria ser divulgada às 17 horas, mas até as 18h30 não estava no site da UFPR.
Dos cotistas negros chamados a dar explicações, 19 não compareceram e 33 tiveram as matrículas canceladas. O reitor da UFPR, Carlos Augusto Moreira Júnior, disse que a instituição vai se defender no caso de eventuais recursos judiciais.
Mas, apesar de anunciar a listagem como definitiva, a UFPR pode ser obrigada a alterá-la. Um candidato ao curso de Engenharia Química conseguiu uma liminar na 7.ª Vara Federal de Curitiba obrigando a instituição a fazer sua matrícula. O candidato alegou não ter sido classificado em razão da reserva de 20% das vagas para negros e 20% para egressos de escolas públicas. Das 88 vagas, ele ocuparia a 63.ª. Com as reservas, ficou na 20.ª posição na lista de espera.
A Justiça determinou ainda que a UFPR apresente a relação dos nomes e notas finais de todos os aprovados para o curso de Engenharia Química, sob pena de multa de R$ 10 mil por dia.