Título: Consumo faz PIB subir 5,2% em 2004
Autor: Irany Tereza
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/03/2005, Economia, p. B1

A economia brasileira cresceu 5,2% em 2004 em relação a 2003, ano em que o resultado patinou em 0,5%. Mais do que a comparação com a base deprimida, pesou para o desempenho - o melhor desde 1994 - a reação da demanda interna, que, além de sair de uma série de resultados anuais negativos, ultrapassou em importância as exportações, setor que vinha exercendo o papel de locomotiva da economia desde 2001. Do saldo total, 4,1% se deveu à contribuição interna e 1,1% à externa. O consumo das famílias, responsável por 56,7% do Produto Interno Bruto (PIB) total do País, estimulado por um pequeno crescimento real da massa salarial (1,5%), aumentou 4,3%. Foi resultado direto da ampliação do acesso ao crédito que multiplicou os financiamentos (e os lucros) bancários. "A grande mudança que tivemos em 2004 foi na composição do PIB", ressaltou Rebeca Palis, economista do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), durante a divulgação.

O levantamento revelou também um expressivo aumento do volume de investimentos no ano (10,9%), que ficou basicamente concentrado no terceiro trimestre (19,2% ante igual período de 2003). Nos últimos três meses de 2004, já sob a austeridade da série de sucessivas altas de juros iniciada em setembro, os investimentos também caíram (9,3%, no mesmo tipo de comparação).

A redução do ritmo geral de retomada no quarto trimestre é a grande preocupação para 2005. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) - também vinculado ao Ministério do Planejamento, como o IBGE - já trabalha na revisão das projeções para o ano, que serão divulgadas na próxima semana, em boletim trimestral. A tendência é de que a estimativa de alta do PIB de 3,8% para este ano seja um pouco mais modesta.

"Não deve cair muito. Mas a boa notícia é que, mesmo que fique em torno de 3,5%, vai se manter acima da média de dez anos, que é de 2,4%", diz Estêvão Kopschitz, economista do Grupo de Acompanhamento Conjuntural do Ipea. Também será revista a taxa de investimento de 2004, ou seja, quanto do total do PIB foi aplicado (pelos setores público e privado) para financiar o desenvolvimento. Estimada, há três meses, em 19,9%, essa taxa deverá se situar alguns décimos abaixo. O resultado oficial só será divulgado pelo IBGE no fim do mês.

Em seu relatório de análise do PIB, o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi) debita à manutenção da alta dos juros - que, segundo o Banco Central, deve se manter por um período de tempo "suficientemente longo" - a desaceleração, notada com mais clareza na indústria. "Ocorreu uma muito significativa contração do investimento, com a formação bruta de capital fixo (rubrica técnica que define o investimento) registrando declínio de 3,9% no quarto trimestre", diz o relatório, destacando as evoluções dos três trimestres anteriores, respectivamente de 2,8%, 3,4% e 6,4%".

"Os lembretes que esses resultados suscitam não poderiam ser outros: tratar mal a 'galinha dos ovos de ouro' da economia, como tem sido a atividade industrial no período mais recente, nunca foi uma sadia recomendação econômica. A mesma sabedoria diz que tampouco é conveniente maltratar a célula-tronco da atividade econômica, qual seja, o investimento", diz o texto.

A técnica Rebeca Palis, do IBGE, diz que os resultados de 2004 são "parte de um ciclo" de crescimento, mas explica que não há como prever por quantos trimestres será possível manter um crescimento expressivo porque "o Brasil não tem um padrão histórico" de comportamento econômico, resultado de sucessivas mudanças no modelo da economia. Segundo ela, só dá para afirmar "que os resultados não vão ficar eternamente para cima".

A explicação de Rebeca fica patente no acompanhamento do comportamento trimestral do PIB, uma alternância de altas e baixas que raramente reúne mais do que quatro trimestres numa mesma curva (seja ascendente ou descendente). Estamos agora num período de subida, com quatro altas trimestrais consecutivas. O consumo das famílias, por exemplo, depois de nove trimestres sem crescimento (de 2001 a 2003) iniciou um período de variações positivas que já está no quinto trimestre. Rebeca ressalta, porém, que ainda é cedo para saber que efeito a alta dos juros pode ter neste comportamento.