Título: Credores vão à Justiça contra Serra
Autor: Silvia Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/03/2005, Metrópole, p. C5

Os grandes credores da Prefeitura de São Paulo prometem entrar na Justiça ainda nesta semana contra o plano de pagamentos anunciado pelo governo José Serra para quitar uma dívida de curto prazo no valor de R$ 2,1 bilhões herdada da administração passada. Tema, por sinal, que dominou a agenda do tucano nos primeiros 60 dias de gestão. Reunidos em seis sindicatos de setores da construção civil, limpeza urbana e vigilância privada, os empresários estudam qual medida jurídica será tomada. "Diante da postura da Prefeitura, que se nega a negociar com os empresários, não nos restou outra alternativa a não ser a Justiça", disse o vice-presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), Luiz Antônio Messias.

Os empresários querem que os pagamentos sejam feitos de acordo com a ordem cronológica dos serviços prestados. Ou seja: quem prestou serviço no mês de agosto tem de receber antes de quem o fez em setembro. Pela decisão anunciada na quinta-feira, receberão primeiro os credores que tiverem valores menores. Até R$ 100 mil, a dívida será paga em um única parcela ainda neste ano. Acima disso, será quitada aos poucos nos próximos sete anos.

Segundo a Prefeitura, 90% dos quase 13 mil credores seriam beneficiados pela medida. A dívida com esse grupo é estimada em R$ 88,6 milhões. Em ralação aos outros mil credores, a soma é bem maior: R$ 1,6 bilhão. Se esse cronograma de pagamentos for mantido, Serra pode comprometer em dívidas quase um terço (31,6%) da receita corrente líquida - critério para cálculo do endividamento do município, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)

Segundo Messias, o objetivo não é encontrar culpados, mas assegurar uma renegociação da dívida englobando todos os envolvidos. Ontem, mais uma entidade engrossou a ofensiva dos empresários contra o prefeito. A Ação Brasileira de Apoio ao Setor de Serviços (Abrasse) divulgou nota de repúdio à medida, acusou a Prefeitura de calote e convocou os empresários para uma reunião amanhã na OAB-SP.

A Prefeitura alega que a medida é a forma encontrada para "apagar o incêndio" nas finanças paulistanas, expressão das mais repetidas pelos secretários tucanos. Medidas como uma dura política de quitação de dívidas e aumento de tarifas fazem parte da "arrumação da casa", como definem tucanos como o vereador José Police Neto. "O que a cidade pode ver é que se iniciou uma gestão fiscal responsável. A chiadeira dos credores é compreensível, mas o fato é que seria preciso parar a Prefeitura por quatro meses para pagar tudo, sem nenhum outro gasto."

Para os petistas, porém, os primeiros dois meses de gestão tucana demonstram "uma política de concentração de poder e falta de rumo". "Para justificar a inoperância de um governo que não consegue cortar o mato ou tapar buraco das avenidas, eles passam o tempo procurando defeito na gestão Marta Suplicy", disse o líder do PT na Câmara Municipal, vereador João Antônio.

"Estamos diagnosticando a situação real para criar políticas públicas sólidas", rebateu o líder do governo na Casa, José Aníbal (PSDB). "Não se constrói política pública sobre fantasias, pois elas não se sustentam, como se vê hoje com o sistema de transporte."

Foi da Câmara, por sinal, que veio o prenúncio de um início difícil para a gestão tucana. Mal havia recebido o cargo de Marta Suplicy (PT), Serra soube que seu candidato oficial à presidência do Legislativo, o vereador Ricardo Montoro (PSDB), era derrotado pelo ainda colega de bancada Roberto Tripoli (sem partido).

Passado o impacto do episódio, Serra e Tripoli se encontraram algumas vezes, inclusive na primeira sessão ordinária da Câmara, que marca o início do ano legislativo. Publicamente, ambos fizeram questão de afinar o discurso em nome da boa relação institucional entre os poderes. No sábado, outro gesto reforçou a importância disso: o pai de Tripoli, Ricardo Tripoli, foi nomeado coordenador de programas e ficará no gabinete do prefeito.