Título: Ficou mais difícil reajustar os salários do Judiciário
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/03/2005, Nacional, p. A5

A decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE), de desistir do aumento de rendimentos para o Legislativo atrapalhou os planos do presidente do STF, Nelson Jobim. O Poder Judiciário ficou numa saia justa porque terá de fazer um lobby a essa altura difícil, no Congresso, para conseguir aprovar o projeto de lei que reajusta os salários dos magistrados e fixa o teto do funcionalismo público. O projeto de lei que Jobim quer aprovar no Congresso aumenta os salários do ministros do STF de R$ 17,3 mil para R$ 21,5 mil retroativamente a janeiro. A proposta prevê ainda um reajuste em janeiro de 2006, quando os salários passariam a R$ 24,5 mil.

Como há uma vinculação entre as várias instâncias da Justiça, haverá uma elevação de salários em cascata no Judiciário, o que representará um gasto extra de R$ 484,1 milhões, ou sete vezes mais que o rombo que será causado se houver aumento para os congressistas.

Esse mesmo fenômeno deveria ocorrer no Legislativo se fosse aprovado um projeto aumentando os rendimentos dos parlamentares para R$ 21,5 mil. No Congresso, o custo seria de R$ 77,1 milhões. Mas é provável que os legislativos estaduais e municipais também pleiteassem em seguida reajustes de salários.

A Constituição prevê que os deputados estaduais devem receber no máximo 75% do que é pago aos federais, ou seja, R$ 16,125 mil. Isso representaria um gasto extra de cerca de R$ 90 milhões. Quanto aos vereadores, a Constituição prevê que eles devem receber entre 20% e 75% do que é pago aos deputados estaduais. O gasto com a atualização dos contracheques na Justiça e no Legislativo poderia chegar a R$ 1,196 bilhão, sem considerar eventuais reajustes no Judiciário dos Estados.

Se o reajuste fosse para todos, o projeto do Judiciário tramitaria rapidamente e em caráter de urgência e os contracheques poderiam engordar já nos próximos meses. A proposta para os parlamentares seria colocada em votação em seguida. Agora, como é apenas para os juízes, o projeto poderá demorar mais tempo para ser aprovado.

ABATIMENTO

Hábil negociador político e possível candidato a um cargo no Executivo em 2006, Nelson Jobim era ontem o retrato da derrota.

Antes da sessão de julgamentos do Supremo, sentou-se em um sofá, acendeu um charuto e ficou, sozinho, olhando para o nada. Com a chegada dos colegas de tribunal, iniciou a sessão e presidiu os trabalhos até as 16 horas.

No intervalo, procurado por jornalistas, evitou responder a perguntas. Diante das indagações, respondia apenas "hã?", como se não tivesse entendido bem as palavras. Perguntado sobre a viabilidade da proposta de aumento do Judiciário após a desistência do reajuste no Legislativo, Jobim afirmou apenas que "o projeto está lá (no Congresso)".

Depois do intervalo, os ministros voltaram para a sessão de julgamentos. Jobim não. Ele estaria indisposto. Questionada a respeito, sua assessoria informou que, na realidade, o presidente do STF estava bem, mas tinha questões a resolver em seu gabinete.