Título: Dirceu fala em retomada de negociações sobre Alca
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/03/2005, Nacional, p. A9

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, descreveu os encontros que teve ontem com a secretária de Estado dos Estados Unidos, Condoleezza Rice, e com o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Stephen Hadley, como eventos "de afirmação das boas relações entre Brasil e Estados Unidos e do bom entendimento entre os presidentes Bush e Lula". Primeiro integrante do governo a ter contato com a nova equipe de política externa do segundo governo de George W. Bush, Dirceu disse que na conversa com Condoleezza reiterou a expectativa de Lula de receber a visita do presidente americano ainda este ano. Embora ainda não haja confirmação, a viagem de Bush ao Brasil deve ocorrer em novembro, próximo à 4.ª Cúpula das Américas, na Argentina, em novembro. De acordo com Dirceu, que passou o início da semana em contatos nos meios empresariais, diplomáticos e acadêmicos em Nova York, suas conversas na capital americana confirmaram que "há bons sinais de retomada da negociações da Área de Livre Comércio das Américas (Alca)" e "compreensão da parte do governo dos EUA sobre a importância da integração da América do Sul, do avanço do Mercosul". Ele disse ter ficado satisfeito por ter ouvido de Condoleezza palavras de reconhecimento "do papel do Brasil nessa integração, da importância do desenvolvimento econômico e do aumento do comércio para a consolidação da democracia na região e a superação da instabilidade que muito dos nosso países viveram nos ultimo anos".

INTEGRAÇÃO

Sublinhando que fez a visita a Washington "a pedido do presidente Lula e do chanceler Celso Amorim", o principal ministro político do governo disse que o projeto de integração da América do Sul é um projeto econômico e não tem a pretensão de excluir ninguém. "Os EUA têm uma presença grande na economia brasileira e integração é uma oportunidade também para os investidores americanos", argumentou. "Não se trata de contrapor o Mercosul aos Estados Unidos, ou à Alca, não se trata de fazer a integração contra os EUA, mas uma integração que vise a melhorar a eficiência."

O porta-voz do Departamento de Estado, Richard Boucher, também fez descrição positiva da reunião entre Dirceu e Condoleezza. "Foi um bom encontro", afirmou. Além de mencionar temas óbvios, como a Alca, Boucher destacou a conversa "sobre encontros vindouros sobre o Oriente Médio, onde é bastante clara para nós e para o Brasil a importância não apenas de reformas políticas e econômicas, mas das reformas democráticas".

Em seu relato, Dirceu contou que a secretária de Estado destacou a importância e a relevância da reunião de cúpula entre os países do Mercosul e as nações árabes, que Lula hospedará este ano no Brasil. "Ela disse que considera muito importante que essa reunião aconteça, que há um grande esforço no Oriente Médio pelo avanço da democracia e para chegar à paz entre Israel e a Autoridade Palestina." Independente das razões que inspiraram a convocação dessa reunião, o ministro indicou que há uma coincidência de interesses entre o Brasil e os EUA, que vêem hoje a democratização do Oriente Médio como prioridade de sua política externa.

"Trata-se de uma oportunidade para os países da América do Sul, que viveram momentos de ditadura e hoje têm processos democráticos em consolidação ou consolidados, (dar) aos países árabes (a possibilidade de) avaliar a importância que a democracia tem no avanço econômico e social dos povos", afirmou Dirceu. "Ela fez questão de destacar que os EUA vêem com bons olhos a realização desta conferência." Sobre as tensões entre os EUA e a Venezuela, e os conflitos na fronteira entre Venezuela e Colômbia, Dirceu contou que não ouviu reclamações e reiterou que "o Brasil, sempre que demandado, jogará um papel de procurar ajudar na solução, através do diálogo, de possíveis divergências, até mesmo internas dos países da América do Sul".

Segundo ele, a única nota discordante da conversa foi Cuba. "Houve concordância na discordância", disse. "A doutora Condoleezza Rice reiterou a posição pública do governo dos EUA e nós reiteramos a nossa posição de que o importante neste momento é mais relações, mais comércio, mais investimento, mais viagem, mais remessas de recursos dos familiares para Cuba, mais normalidade para o desenvolvimento das relações entre os Estados Unidos e Cuba."

O ministro contou ainda que Condoleezza destacou a questão dos direitos humanos em Cuba. O ministro Dirceu afirmou que "o Brasil tem posição clara sobre isso", que é se abster quando esse assunto é tratado na Comissão dos Direitos Humanos na Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra.