Título: Para especialistas, calote custou caro
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/03/2005, Economia, p. B9

Diante do sucesso da renegociação da dívida argentina, algumas pessoas se perguntam se o calote não poderia ser uma opção para o Brasil. A dívida pública brasileira, que corresponde a cerca de 51% do PIB, suga recursos que poderiam ser investidos em áreas como educação e infra-estrutura. Mas deixar de pagar a dívida, afirmam economistas, não foi simplesmente uma decisão da Argentina que pode ser imitada pelo Brasil. Foi uma falta de opção, após uma crise econômica insustentável. "A Argentina entrou em crise e a moratória era a única opção", afirma o economista Antônio Corrêa de Lacerda, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos sobre Empresas Transnacionais e Globalização (Sobeet). "Esse não é o caso do Brasil."

O economista Nouriel Roubini, professor da New York University e ex-assessor econômico do presidente Bill Clinton, afirma que o calote argentino não vai servir de exemplo porque não é uma alternativa fácil ou indolor. "A Argentina passou por uma crise severa, com queda de mais de 25% no PIB, perdeu 6 anos de crescimento e teve taxas altíssimas de pobreza e desemprego", diz Roubini no blog que mantém na internet. "Com tudo isso, alguém ainda acha que outros países vão sair correndo para dar calote como a Argentina fez?"

Segundo Roubini, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, assim que foi eleito, olhou para a Argentina e "viu os efeitos colaterais de um calote - mesmo um calote inevitável como o argentino". "Por isso, Lula acertadamente resolveu fazer um acerto fiscal e evitar a moratória. A lição da Argentina é que crise e calote custam muito caro."

De acordo com Roubini, daqui para frente a Argentina terá de manter um superávit primário de 4% do PIB para honrar sua dívida reestruturada e ter disciplina fiscal para evitar um crescimento da dívida. Mas, tendo em vista que o calote era a única opção para os argentinos, ainda não dá para avaliar se a moratória foi um bom negócio para eles, diz Lacerda.

"Precisamos ver se o calote será superado pelos credores e os investimentos vão voltar à Argentina, ou se a reestruturação será um marco negativo na história do país, que afastará os investidores por um bom tempo."