Título: Síria deve anunciar hoje saída parcial
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/03/2005, Internacional, p. A20
O presidente da Síria, Bashar Assad, deve anunciar hoje em um discurso no Conselho do Povo (Parlamento), em Damasco, a retirada das tropas sírias para o Vale do Bekaa, no leste libanês, informou ontem o ministro da Defesa do Líbano, Abdul-Rahim Murad. A remoção ocorreria antes da cúpula da Liga Árabe, marcada para o dia 23, em Argel. Segundo a agência oficial síria, a Sana, Assad fará a inesperada visita ao Parlamento para falar dos "desdobramento políticos atuais". Já o vice-chanceler sírio, Walid al-Mualem, disse em Moscou que seu país anunciará "em breve" um plano para que as tropas deixem o território libanês em cumprimento ao Acordo de Taif, que pôs fim à guerra civil libanesa (1975-90).
"Ninguém sabe o que o presidente Assad vai dizer, exceto ele mesmo, mas nós esperamos que anuncie um deslocamento (das tropas) para a regiões do Bekaa", disse Murad.
Quando jornalistas lhe perguntaram se haveria a retirada completa, Murad respondeu negativamente e frisou que a transferência para o Bekaa está em conformidade com o Acordo de Taif. Esse pacto previa a remoção dos soldados do litoral e outras partes do Líbano para a região na fronteira com a Síria. A retirada total teria de ser definida em negociações posteriores, nunca realizadas.
Além de querer preservar sua influência sobre o Líbano, a Síria tem interesse em manter as tropas no país para garantir a segurança de Damasco, que fica a poucos quilômetros da fronteira libanesa - e de Israel - e também para ter um trunfo quando houver negociações com os israelenses sobre as colinas sírias do Golã, ocupadas pelo Estado judaico desde 1967.
Pouco depois da divulgação dos comentários do ministro libanês, o presidente dos EUA, George W. Bush, voltou a advertir a Síria de que não aceitará "meias medidas". "Quando dizemos retirada queremos dizer retirada completa, não pela metade", "As tropas sírias e os serviços sírios de inteligência têm de sair do Líbano agora." declarou, em New Jersey. Numa entrevista ao diário New York Post, publicada ontem, Bush deu como prazo final o mês de maio, quando serão realizadas eleições parlamentares no Líbano. Os EUA também pressionam o governo sírio a deixar de dar apoio aos grupos palestinos que têm sede em Damasco e não permitir que seu território seja usado por rebeldes iraquianos.
Depois do atentado que matou o ex-primeiro-ministro libanês Rafic Hariri, no dia 14, ganharam força rapidamente no Líbano as manifestações pela retirada das tropas - já que a oposição culpa a Síria pelo assassinato. Esse movimento é forte entre os sunitas, drusos e cristão maronitas. Os xiitas, a maior comunidade do Líbano, permanecem afastados da mobilização popular que levou à renúncia, na segunda-feira, do governo do pró-sírio de Omar Karami.
Ontem, o deputado Mohamad Fneich, da organização xiita libanesa Hezbollah (apoiada pela Síria e Irã), disse que o grupo está disposto a "assumir a defesa estratégica de Damasco no caso de a Síria tirar suas tropas do Líbano". Segundo Hassan Khalil, um dos líderes do Hezbollah, a principal preocupação do grupo no momento é manter sua milícia. "Nós esperamos não tomar partido, mas queremos ser a parte que unirá os dois lados", acrescentou Khalil.