Título: Acordo na OMC avança um pouco
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/03/2005, economia, p. B11

Os ministros de 30 países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), reunidos no Quênia, superaram ontem as divergências técnicas sobre o capítulo agrícola da Rodada Doha. Na semana que vem, os negociadores estarão em Genebra para continuar os trabalhos técnicos. Em contrapartida, não houve acordo sobre a liberalização de produtos industriais e de serviços. "Obtivemos avanços pequenos, mas foi uma reunião positiva", comentou o chanceler brasileiro, Celso Amorim.

A OMC tem a meta de fechar um acordo sobre o ritmo de cortes de tarifas até dezembro. Mas, para que isso ocorra, os países devem contar com um primeiro esboço de acordo até julho. O principal problema era a resistência dos europeus em transformar suas tarifas de importação de produtos agrícolas em um modelo que pudesse ser alvo de liberalização.

Os europeus têm cerca de 6 mil tarifas cobradas a partir do volume de importação, e não do valor. Todos concordam que só a transformação das tarifas pode permitir uma negociação sobre redução das barreiras, mas Bruxelas tentava retardar o processo.

Depois de bloquear os debates em Genebra e passar a quinta-feira em discussões ásperas, a Europa acabou aceitando iniciar o processo sobre suas tarifas. "Vamos pôr todos os números sobre a mesa nas próximas semanas", disse Marianne Fisher Boel, comissária de Agricultura da União Européia (UE). A idéia é que, com os números, possam ser feitos cálculos de quanto são as tarifas reais até abril. "Os prazos são apertados."

Amorim criticou a posição de Bruxelas. "Eles apresentaram a questão como se fosse um ponto das negociações, quando, na verdade, se trata de algo meramente técnico. Esse é um tema que não deveria ter sido politizado nem barganhado. Felizmente, houve um entendimento sobre isso."

"Avançamos apenas 5% do caminho', afirmou um negociador indiano. Para Peter Allgeier, principal negociador dos EUA, as negociações agora estão no caminho certo.

Os dois dias de negociações no Quênia ainda serviram para a apresentação de novas propostas. No setor agrícola, a Índia propôs a tarifa de importação de 100% como teto para todos os países. Hoje, os americanos têm taxas de até 350% para o tabaco. Mas a idéia de Nova Délhi não tem nem o apoio do Brasil. Brasília acredita que essa não é a forma de lidar com o problema.

Hong Kong sugeriu a decretação de moratória e que nenhum país adotasse novas regras restritivas no setor de serviços. Os países ricos se queixam de que as economias emergentes até agora não fizeram ofertas substanciais de abertura de setores como financeiro e telecomunicações. A idéia de Hong Kong foi aplaudida pelos europeus e rejeitada pelo Brasil.

"Temos um déficit de regulamentação tanto na área financeira quanto na trabalhista e não podemos abrir mão disso", afirmou Amorim. Segundo ele, o Brasil ainda precisa garantir que a OMC preserve espaço para políticas públicas e para o desenvolvimento industrial.