Título: Para governo, projeto de corte de subsídios dos EUA é insuficiente
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/02/2005, Economia, p. B3

Negociador diz que objetivo é reduzir subsídios em 70%; proposta prevê corte de 5% GENEBRA - O governo brasileiro afirma que a decisão da administração de George W. Bush de propor ao Congresso americano uma redução dos subsídios domésticos é "um sinal positivo" para as negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC), que em 2005 entram em sua fase decisiva. Mas o principal negociador brasileiro na Organização Mundial do Comércio (OMC), embaixador Clodoaldo Hugueney, alerta que o objetivo do governo é o de conseguir na OMC uma redução de 70% dos subsídios domésticos americanos no fim de um período de transição ainda a ser negociado. "Temos muito trabalho pela frente ainda", admite o negociador. A Casa Branca enviou ontem ao Congresso americano seu plano de orçamento para o ano fiscal de 2006. Diante da pressão para reduzir o déficit do país, Bush prevê a diminuição do apoio governamental aos produtores agrícolas, criticados pelo Brasil por distorcerem o mercado internacional. O projeto de lei indica a possibilidade de um teto de US$ 250 mil em subsídios para cada fazendeiro, volume que hoje pode ultrapassar US$ 1 milhão. No total, o corte reduziria 5% do valor dos subsídios de Washington a seus produtores.

Na avaliação de Hugueney, o passo é importante porque vai na direção contrária da lei agrícola aprovada pelo congresso americano em 2002, que previa aumento de subsídios. "Não me interessa se o corte está sendo realizado por necessidades internas dos americanos. O importante é que há um corte e estamos indo na direção oposta ao programa de 2002", afirmou o negociador brasileiro, que ontem participou da primeira reunião da OMC no ano para tratar da liberalização agrícola.

O Brasil quer que o corte nos subsídios domésticos não ocorra a partir dos níveis permitidos pela OMC, normalmente acima do patamar de apoio dos governos ricos. "Não queremos cortar água. Queremos que a redução ocorra no volume aplicado pelos governos", afirma Hugueney. Segundo ele, os americanos teriam direito de dar US$ 29 bilhões em seus vários programas de subsídios, mas o apoio real chegaria apenas a US$ 16 bilhões em 2003.

"Estamos insistindo sempre na mesma cartilha. Precisamos de cortes substanciais de subsídios domésticos", afirmou o embaixador. Para ele, a fórmula que regulamentará essa redução deve prever cortes mais significativos aos países que mais subsidiam sua produção. A esperança dos negociadores é de ter tal fórmula aprovada até a reunião ministerial da OMC em Hong Kong, em dezembro.

O governo australiano também elogiou a iniciativa de Bush. Para o ministro do Comércio da Austrália, Mark Vaile. a iniciativa mostraria que a Casa Branca está comprometida com a rodada da OMC. Ele admitiu, porém, que o corte ainda não está aprovado e o projeto terá a dura oposição do lobby agrícola americano.

Para diplomatas de outros países na OMC, a iniciativa americana poderia representar um início da reforma da política agrícola dos Estados Unidos, ainda que muitos estejam cautelosos em indicar quais seriam as reais conseqüências para as negociações em Genebra.

"Precisamos olhar primeiro o projeto e analisar o que de fato representará", afirmou um negociador europeu, também pressionado a reduzir subsídios. A notícia de Washington chega no mesmo momento em que Bruxelas anuncia a recriação de seu programa de subsídios ao trigo, após 18 meses de interrupção.

REUNIÕES

Parte dos debates sobre a agricultura serão tratados em vários encontros entre Brasil e EUA nos próximos dias. Amanhã, em Genebra, Hugueney se reúne com o principal negociador agrícola da Casa Branca, Allen Johnson. No sábado, os brasileiros passam o dia em negociações com outros países a convite do vice-representante de Comércio dos Estados Unidos, Peter Allgeier. Na segunda-feira, é a vez do Brasil voltar a se reunir isoladamente com Allgeier para debater o futuro das negociações.