Título: Plano contra a pirataria
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Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2005, Editorial, p. A3

O Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual finalmente elaborou documento pelo qual o Brasil esperava há pelo menos 15 anos - o Plano Nacional de Combate à Pirataria. Nos dias 27 e 28 de fevereiro, seus integrantes definiram 92 ações para coibir práticas de contrabando, descaminho e falsificação de mercadorias, atividades que movimentam anualmente US$ 18 bilhões no País, reduzem a arrecadação em US$ 3 bilhões e eliminam 2 milhões de empregos formais.

O plano foi apresentado um mês antes de expirar o prazo final concedido pelo governo dos Estados Unidos para que o País adotasse medidas efetivas de combate à pirataria, sob pena de ser excluído do Sistema Geral de Preferências (SGP), instrumento que reduz tarifas de importação de produtos originários de países em desenvolvimento.

Conforme o secretário-executivo do Conselho, Márcio Costa de Menezes e Gonçalves, havia previsto, há 15 dias em entrevista ao jornal Valor, o plano traçado ainda é um esboço, que voltará a ser discutido na próxima semana. Apesar disso, já delineia três principais diretrizes de ação: a redução da diferença de preços existente entre os produtos originais e os falsificados - para eliminar o maior incentivo à compra da mercadoria pirateada -, o fortalecimento da fiscalização e repressão e a educação.

Os representantes da indústria no Conselho se comprometeram a achatar a distância entre os preços. Para isso, esperam por redução de impostos nos setores que hoje amargam os maiores prejuízos com a pirataria. É justo que o governo arque com parte do custo do combate às falsificações.

O governo terá, também, de contratar mais fiscais para os portos e fronteiras terrestres, medida prioritária até para provar a sua disposição em atender, na prática, às exigências feitas pelos Estados Unidos. A Receita Federal já requisitou ao Ministério do Planejamento autorização para a realização de concurso para contratação de 2 mil novos técnicos e 1,5 mil auditores para atuar no combate à pirataria.

As polícias terão, conforme o plano, divisões específicas de repressão ao contrabando e descaminho e de combate à pirataria. O Conselho Nacional de Combate à Pirataria também recomendará ao Judiciário a criação de varas especializadas em propriedade intelectual, assim como de promotorias especiais no Ministério Público. No ano passado, foram abertos 7,5 mil processos por crime de pirataria de produtos audiovisuais, mas houve apenas 14 condenações.

A diretriz que estabelece as ações educativas pretende atingir, além da sociedade, por meio de campanhas de esclarecimento sobre os prejuízos causados pelo consumo de produtos pirateados, os próprios agentes responsáveis pelo combate à prática: nas academias de polícia e órgãos de formação de fiscais federais, estaduais e municipais, a repressão à pirataria deverá ser disciplina obrigatória nos currículos.

O plano prevê ainda medidas essenciais para as operações de combate, como a instalação de um banco de dados sobre pirataria no Brasil, interligando os órgãos de fiscalização com as polícias estaduais e federais. A adequação da legislação também é defendida pelos membros do conselho. Hoje, quando se apreendem 500 mil CDs falsificados, é preciso periciar um por um e elaborar um laudo sobre cada unidade. Pretende-se autorizar a perícia por amostragem, para que a destruição dos produtos ilícitos seja mais rápida, ajudando a esvaziar os depósitos da Receita e da Polícia Federal.

Advogados especialistas em propriedade intelectual lembram a necessidade de tornar mais rígida a punição dos falsificadores. Hoje, a pena não passa de quatro anos de prisão. Em muitos países, a punição não se restringe ao fabricante de produtos falsificados. Lojas e empresas são processadas pelos crimes, fechadas e impedidas de participar de licitações. Até donos de imóveis alugados ao comércio ou a empresas que usam produtos falsificados podem ser punidos.

É evidente que a aplicação de muitas dessas medidas exige tempo, mas as principais podem ser tomadas no curto prazo, como o aumento da fiscalização e repressão e a redução dos preços dos produtos originais. Ao fazê-lo, o governo não estará simplesmente cedendo a exigências dos Estados Unidos e de outros países industrializados. Estará atendendo a um dos mais genuínos interesses nacionais.