Título: Supremo livra Lula de se explicar sobre denúncia de corrupção
Autor: Mariângela Gallucci
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2005, Nacional, p. A4

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva escapou do constrangimento de ter de explicar na Justiça as afirmações de que teria abafado supostos atos de corrupção em privatizações feitas no governo Fernando Henrique. O ministro Sepúlveda Pertence, do Supremo Tribunal Federal (STF), arquivou ontem pedido do PSDB para que Lula esclarecesse seu discurso feito dia 24 em Jaguaré (ES), em que disse que soube da corrupção por um "alto companheiro" e o orientou a não divulgá-la. Pertence rejeitou o pedido porque concluiu que o PSDB não foi ofendido pelo discurso de Lula e o partido não tem legitimidade para questionar a suposta difamação casualmente dirigida a seus filiados. "Nada, nas questões postas pelo partido interpelante, lhe diz respeito", afirmou em seu despacho. "Não há cogitar de fato concreto ofensivo à reputação do PSDB - menos ainda, imputável ao presidente da República - na referência, em seu discurso, a que alguém se houvesse referido a processo de corrupção, a caso ocorrido antes do governo atual."

Para Pertence, que é amigo de Lula e na eleição de 98 foi cotado para ser seu vice, a interpelação não pode substituir investigação para verificar se houve acobertamento de corrupção. Mas ele avalia que o PSDB queria obter confirmação de eventual omissão de Lula e não esclarecer ofensa ao partido. O ministro chegou a essa conclusão ao analisar as 4 perguntas do PSDB a Lula. Após receber as respostas, o partido analisaria a possibilidade de entrar com ação penal contra o presidente.

ARGUMENTO

"A primeira (pergunta) - se realmente tomou conhecimento de 'processo de corrupção grande' e mesmo assim não ordenou sua apuração -, tende a obter confirmação de omissão eventual do chefe do Executivo a deveres funcionais, o que, à evidência, não visa a esclarecer ofensa a partido algum", disse. Para demonstrar o desvio de finalidade no pedido de explicações, Pertence citou a segunda pergunta do PSDB também. Para ele, ao perguntar quem era "o alto companheiro" citado por Lula, o partido queria na realidade a delação do autor da frase.

Seu despacho baseia-se em decisões anteriores do STF. Numa delas, o tribunal rejeitou pedido de explicações da Associação dos Juízes Classistas da Justiça do Trabalho a respeito de declarações do então ministro da Justiça. Segundo aquele julgamento, só quem se julga ofendido pode pedir explicações em juízo. "O reconhecimento da legitimidade ativa para a medida processual da interpelação judicial exige a concreta identificação daqueles (os juízes classistas no caso) que se sentem ofendidos em seu patrimônio moral", concluiu o STF na ocasião.