Título: Brasil propõe relatório da ONU no lugar do americano
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2005, Nacional, p. A8

O governo brasileiro quer enfraquecer os relatórios produzidos pelos Estados Unidos e pela União Européia sobre a situação dos direitos humanos no mundo. O Brasil está sugerindo oficialmente à ONU a criação de uma avaliação anual da situação dos direitos humanos de todos os países, documento que seria elaborado por funcionários das Nações Unidas. Hoje, só as maiores potências preparam tais documentos e publicam uma vez por ano a lista negra dos países que mais violam direitos básicos. Há duas semanas, Washington anunciou sua avaliação e não poupou críticas ao Brasil. O relatório do Departamento de Estado acusava o País de ter uma polícia responsável por detenções arbitrárias, assassinatos e ter um sistema judiciário pouco confiável. A avaliação do governo de George W. Bush ainda atacou países como Síria, Irã e Coréia do Norte.

Para tentar despolitizar a avaliação sobre direitos humanos e evitar que esses relatórios sejam seletivos, contra apenas um grupo de nações, o Brasil propõe que a ONU estude a situação internacional todos os anos e publique os próprios resultados.

A sugestão será oficializada na semana que vem, quando o secretário de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, vai participar da reunião da Comissão de Direitos Humanos da ONU. Nos próximos dias, o governo fará intenso lobby para conseguir o apoio de outros países. Uma primeira rodada de consultas foi feita com vários governos. Os EUA, tentando evitar que o tema se concretizasse, levantou dúvidas sobre quem financiaria tal proposta.

Já ativistas estão de acordo com a idéia brasileira. Mas questionam dois aspectos. O primeiro se refere aos autores do documento. As organizações não-governamentais (ONGs) querem saber quem vai elaborar a avaliação para garantir a neutralidade das críticas. Para o Brasil, o Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos deveria ficar responsável pela avaliação e o governo estaria disposto a ter no documento informações vindas não apenas dos órgãos oficiais de outros países, mas também de ONGs.

Outra questão é quanto ao controle que será feito por governos sobre o conteúdo do relatório antes de sua publicação. Como são os países que pagam pelo orçamento da ONU, ativistas temem que a avaliação fique limitada por causa da pressão de governos.