Título: Reforma provoca pouco interesse entre ex-dirigentes
Autor: Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2005, Nacional, p. A16

A reforma que o presidente Lula mandou para o Congresso não empolga uma parte dos velhos companheiros que com ele protagonizaram as greves dos metalúrgicos nos anos 70. Hoje aposentados, vivendo modestamente dos proventos que a anistia lhes assegurou, muitos não demonstram interesse na proposta que o governo enviou ao Congresso. "Não vi o texto da reforma, estou bem afastado da política", limita-se a dizer Geraldo Cestavo, com 70 anos, que foi segundo-secretário e tesoureiro do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema. Nélson Campanholo, primeiro-secretário do sindicato, então ajustador da Karman Ghia do Brasil e um dos fundadores do PT - número 3 da comissão provisória de fundação do partido -, hoje com 65 anos, também não conhece a reforma de Lula. "Vi alguns pedacinhos no jornal, mas não peguei ela completa. Não posso dar opinião, não acompanhei mesmo, estou sendo sincero. Eu vi assim, no ar." Nem todos estão alheios à reforma. "Você tem o real e o ideal", avalia Djalma Bom, do Conselho Fiscal e controlador de peças da Mercedes-Benz. "Eu acredito que essa reforma vai em direção à liberdade de autonomia sindical, com pressões no Congresso para aprovação da Convenção 87 da OIT (Organização Internacional do Trabalho) que traz a liberdade e a autonomia sindical."

Para Djalma, uma coisa importante é a formação dos comitês de empresa. "Isso facilita muito a organização do trabalhador dentro da fábrica. Ao mesmo tempo, fortalece o sindicato nas empresas."

CONTRIBUIÇÃO

Ele vê outras vantagens na reforma. "O fim da contribuição sindical e as normas mais rígidas para existência e funcionamento dos sindicatos também são muito importantes", explica. "Fecha a porta dos sindicatos e das federações para os pelegos que vivem em função do imposto sindical. Também barra sindicatos cartoriais, os sindicatos de carimbo."

Djalma acredita que a reforma é um avanço. "Mas é importante que os sindicatos conversem com o governo. O Estado sempre esteve muito mais ao lado do capital do que ao lado do trabalhador."

Rubens Teodoro de Arruda, o Rubão, vice-presidente do sindicato entre 1975 e 1980, admite não saber muito da proposta do antigo companheiro. "Eu não estou inteirado da reforma, não li nada sobre ela. Preciso ler para entender", conta. "Mas quero dizer que os próprios trabalhadores deveriam estar sendo convidados para debater a reforma. Os trabalhadores devem ter oportunidade de apresentar suas idéias e sugestões."

Segundo Devanir Ribeiro, hoje deputado federal pelo PT, a reforma "não é de fato uma peça pronta e acabada". Então empregado da Volks e organizador das grandes jornadas de greve, Devanir considera que a proposta é boa. "Ela foi fruto de uma discussão ampla em todo o Brasil, com todos os sindicatos, com todas as centrais. Pode haver divergências. Vai haver", diz. "No Congresso, ela vai ser enriquecida. Ela não vai sair como entrou. Nenhum projeto entra na Casa e sai do mesmo jeito. Vamos discutir ponto a ponto, o que é a liberdade, autonomia, unicidade, unidade."

Para Devanir, os brasileiros não gostam de mudanças. "De fato, algumas centrais argumentam que a reforma é intervencionista. Infelizmente, os brasileiros são muito conservadores. Não querem mudar nada", avalia. "Temos de mudar. Esse modelo sindical já está superado. Tanto é que São Bernardo, na prática, já superou há muito tempo, aqui tem a diretoria, os conselhos, uma nova forma de dirigir o sindicato."

João Justino de Oliveira, o Janjão, não se ateve à reforma. "Ainda não li nada. Mas é preciso fazer uma grande mudança."

LEGITIMIDADE

Para o atual presidente do sindicato, José Lopez Feijóo, um ponto expressivo da reforma é a exigência de representatividade. "Hoje, o sindicato é reconhecido pelo seu registro e pela concessão da Justiça ou do Ministério do Trabalho e ele passa a ter poderes ilimitados. A partir da reforma, um sindicato, para ser reconhecido como legítimo, tem de ter no mínimo 20% dos sócios na categoria, senão ele existe, mas não tem poder de negociação. Isso modifica brutalmente a maneira como estão estruturadas as organizações sindicais."

Feijóo iniciou a carreira como metalúrgico na Ford, onde começou a trabalhar na função de conferente, em 1973. Sua experiência sindical teve início na Ford em 1982, quando foi coordenador da primeira comissão de fábrica da montadora. "Existem sindicatos que são meras entidades de carimbo, existem para cobrar imposto dos trabalhadores e taxas que estipulam, uma estrutura arcaica que não tem a menor serventia."

Uma das exceções no quadro é o próprio sindicato de Feijóo. "Já praticamos uma forma moderna de atuação, temos comitê sindical de empresa que a legislação não prevê, mas a reforma prevê", conta. "É o direito de organização no local de trabalho que implantamos, mesmo sem proteção da lei."

O sindicato de Feijóo não cobra o imposto sindical. "Todos os anos nós entramos com liminar na Justiça que impede a cobrança. Antes, a gente devolvia os recursos. Já há alguns anos seguimos o modelo do Sindicato dos Eletricitários de Campinas. Conseguimos liminar e o trabalhador metalúrgico não paga mais, é proibido descontar o imposto sindical", diz. "Sobrevivemos da mensalidade sindical, temos 50% da nossa base ativa associada. São 50 mil trabalhadores sócios, voluntários que pagam a mensalidade."