Título: Confronto ameaça projetos da Petrobrás
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Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2005, Internacional, p. A20

A crise política da Bolívia, com a possível saída do presidente, Carlos Mesa, poderá se refletir no Brasil e comprometer projetos entre os dois países. Além do contrato de fornecimento de até 30 milhões de metros cúbicos (m3) de gás por dia, outros empreendimentos bilionários estão em jogo, avaliam especialistas. O diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), Adriano Pires, lembra que Brasil e Bolívia acertaram em agosto do ano passado uma agenda de trabalho para iniciar, a partir de maio, projetos de industrialização do gás na fronteira dos dois países. Trata-se da construção de uma usina petroquímica, uma usina termoelétrica e outra de separação dos componentes liquidificáveis do gás.

Segundo o acordo, o setor privado participaria com 70% dos investimentos e a Petrobrás e uma estatal boliviana, com os outros 30%. Mas a crise no país vizinho traz incertezas em relação ao abastecimento deste polo petroquímico. "Além disso, a instabilidade acaba sendo incorporada aos projetos, que se tornam mais caros e arriscados", diz Pires.

Outra dúvida está nas novas regras do setor energético boliviano, que tendem a elevar a tributação sobre as empresas multinacionais que atuam no País. Nesse aspecto a principal prejudicada seria a Petrobrás, afirma Giuseppe Bacoccoli, pesquisador da Coordenação dos Programas de Pós-graduação de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na área de petróleo. Segundo ele, a estatal brasileira tem uma posição forte na Bolívia, com refinarias, distribuidoras e exploração de campos de gás. "A empresa deve responder por 20% do PIB e da arrecadação da Bolívia."

Bacoccoli afirma que a maior preocupação é que o eventual substituto de Mesa, cuja posição é menos rígida em relação a política fiscal, venha de uma corrente mais dura e defina impostos elevados sobre a produção de gás. Isto poderia prejudicar os resultados da Petrobrás.

Outro foco de atenção refere-se ao contrato de gás entre Brasil e Bolívia de até 30 milhões de m3 por dia, transportado pelo Gasbol (Gasoduto Bolívia-Brasil). Grupos nacionalistas, formados em boa parte pela população indígena, alegam que o gás, a maior riqueza do país, tem de ser vendido por um preço maior ou não ser exportado. O contrato que, no Brasil, já foi motivo de muitos protestos, por estar atrelado ao dólar, poderá ser motivo de renegociações. Desta vez, porém, o País tem pontos a seu favor, como a descoberta de reservas de gás na Bacia de Santos, diz Bacoccoli.