Título: Prejuízo com estiagem inibe investimentos
Autor: Fabíola Salvador
Fonte: O Estado de São Paulo, 08/03/2005, Economia, p. B6
O primeiro dia da Expodireto, em Não-Me-Toque, mostrou que os prejuízos da estiagem de quase quatro meses estão inibindo os investimentos dos agricultores do Rio Grande do Sul em máquinas e implementos agrícolas. Ao contrário das cinco edições anteriores, os visitantes que foram ontem ao parque de exposições preferiram circular pela área de produção vegetal e fizeram só incursões tímidas à área onde as empresas exibem tratores com 16 marchas, adubadoras orientadas por GPS e até um avião agrícola movido a álcool, o Ipanema, entre outros equipamentos. "Não adianta nem ver, se não vou poder comprar", lamentava-se o agricultor Balduíno Soares, evitando o estande de tratores. A opção dos produtores é justificada. "Máquina é o primeiro investimento que cortam", constata Carlos Augusto Feldmann, vendedor da Max, uma fábrica de máquinas agrícolas. "Sem dinheiro, fazem algumas reformas e seguem usando equipamentos velhos". No estande da Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola (Coodetec), o engenheiro agrônomo Antônio Celso Carraro afirmava que "semente eles não podem deixar de plantar".
Para confirmar a tese, as grandes atrações do evento são os lotes de sementes de soja transgênica da Embrapa e da Coodetec cinco dias depois da aprovação, pelo Congresso, da Lei de Biossegurança. Em outubro, quando começar o plantio da nova safra, os produtores poderão, pela primeira vez, comprar sementes certificadas produzidas no Brasil. Isso entusiasmou Guaraci Possebon Nunes que vai substituir progressivamente os 500 hectares que cultiva com grãos multiplicados a partir de sementes vindas da Argentina pelas variedades que a Embrapa e a Coodetec oferecerem. "A grande vantagem será o controle de doenças", acredita Nunes, referindo-se às variedades desenvolvidas no Brasil adequadas aos climas regionais e preparadas para enfrentar doenças que não afetam a produção argentina, de onde vem a soja transgênica que foi plantada no Estado.
Outro produtor, Armando Winter, ainda não decidiu se vai continuar plantando os grãos da soja argentina que guarda de uma safra para outra ou se vai partir para as sementes certificadas. Mas não recua da decisão de cultivar transgênicos, pensando na própria saúde. "Nunca mais tive enjôos por causa dos agrotóxicos", diz, referindo-se à menor dosagem exigida pela soja transgênica.
Dos 22 milhões de hectares que o Brasil planta de soja, cerca de 4 milhões poderão ser semeados com organismos geneticamente modificados neste ano, considerada a potencial oferta da Embrapa, Coodetec e outras empresas, prevê o gerente do Programa de Pesquisa de Soja da Coodetec, Marco Antônio Rott de Oliveira.
Com a capacidade multiplicadora de cada empresa, para a safra 2006/2007 todos os agricultores brasileiros poderão ter acesso à soja transgênica legalizada. "Semente não vai faltar", diz o melhorista de soja da Embrapa Paulo Fernando Bertagnolli.
Ao mesmo tempo em que preparam a mudança para a semente transgênica certificada, os produtores adiam investimentos em máquinas e implementos. "Se a colheita fosse boa, eu trocaria os dois tratores de 1991 que tenho", revela Nunes, preocupado em cobrir os custos de R$ 600 por hectare com uma colheita de menos de 20 sacas por hectare, quando a projeção era de 60 a 70 sacas por hectare. "Dificilmente vai dar para pagar as contas".