Título: Visita ao MST vira ato contra tudo
Autor: Elder OgliariJander Ramon
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/01/2005, Nacional, p. A4

Em assentamento em Tapes, Chávez falou para mil pessoas durante uma hora TAPES - O objetivo anunciado do Movimento dos Sem-Terra (MST) era apresentar ao presidente Hugo Chávez, da Venezuela, um assentamento considerado exemplar. Também constava da programação o plantio de um pé de cedro, num bosque destinado a celebrar a amizade entre os povos. Mas o evento realizado ontem de manhã na zona rural de Tapes, município do interior gaúcho, a cerca de 90 quilômetros de Porto Alegre, foi mais do que isso. Virou um ato de protesto contra o neoliberalismo, o agronegócio, o latifúndio e, principalmente, a política dos Estados Unidos para a América Latina. Participaram do ato o governador do Paraná, Roberto Requião (PMDB), saudado como "velho amigo do MST", e o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto. Na platéia, cerca de mil pessoas, entre participantes do MST e da Via Campesina e simpatizantes. Muitos haviam se deslocado de Porto Alegre.

Chávez discursou sob sol forte, por quase uma hora. Fez ironias e ataques aos EUA. Referindo-se indiretamente ao discurso de posse do presidente George W. Bush, que se disse disposto a defender a democracia em qualquer parte do mundo, afirmou: "Usam a palavra liberdade como máscara que lhes permite sair por aí atropelando os povos." Para ele, a nação americana já nasceu com "ânsia imperialista" e tem desencorajado os projetos de independência latino-americanos desde os tempos de Simon Bolívar - seu grande inspirador na chamada "revolução bolivariana" que estaria em curso na Venezuela. "Há 200 anos o império americano vem impondo seu nariz e sua mão peluda, atropelando nossa América."

O MST também atacou os EUA. No início do ato, jovens atores do movimento fizeram uma encenação em que o chapéu do Tio Sam, com as cores da bandeira americana, apareceu como símbolo de empresas transnacionais que estariam sufocando pequenos agricultores em todo o mundo. Em seguida, o principal líder do MST, João Pedro Stédile, afirmou em seu discurso que um grupo de não mais de 10 grandes empresas transnacionais está se unindo para controlar toda a agricultura e o processo de comercialização de alimentos. "O projeto do capital internacional, que no Brasil chamam de agronegócio, é controlar a agricultura mundial."

Requião também atacou empresas transnacionais, citando particularmente a Monsanto, fabricante das sementes transgênicas. "Os agentes do neoliberalismo vêem o mundo como mercados e mobilizam recursos com a velocidade da cibernética. Para eles não existem cidadãos, mas consumidores."

Rossetto saudou Chávez como uma das maiores lideranças políticas da América Latina e elogiou seu esforço pela integração entre os países do continente. Chávez foi aplaudido diversas vezes enquanto falava. Seu estilo lembra o de seu ídolo Fidel Castro: fala como se estivesse conversando e intercala o discurso com brincadeiras, diálogos com a platéia. Ele disse que estar na presidência é mera circunstância: "Acima de tudo sou um camponês, um soldado."