Título: Brasil quer acordo Mercosul-EUA
Autor: Rolf KuntzEnviado especial
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/01/2005, Economia, p. B1

Amorim propõe a negociação bilateral como uma etapa para a formação da Área de Livre Comércio das Américas DAVOS - O chanceler Celso Amorim propôs a negociação de um acordo comercial entre Mercosul e Estados Unidos ao representante americano para Comércio Exterior, Robert Zoellick. Este não respondeu sim nem não. Esse acordo seria o meio mais simples para conseguir acesso ao mercado americano, comentou o ministro brasileiro. "Precisamos ir direto aonde está o bife", argumentou. Com esse entendimento, faltaria pouco para a formação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), disse ainda o ministro. "Mas eles têm lá as suas dificuldades", ressalvou, comentando a hesitação americana diante da proposta. Amorim passou a manhã com Zoellick num hotel de Davos. Primeiro discutiram a negociação global de comércio com ministros de vários países (ver matéria ao lado). Depois, numa conversa bilateral, falaram sobre Alca, relações Mercosul-EUA e política da América Latina e do Caribe. Zoellick deixará em breve de ser o representante s para Comércio Exterior e se tornará subsecretário de Estado, convidado pela secretária Condoleeza Rice.

As negociações da Alca empacaram em maio do ano passado. "Não estão mortas", disse Zoellick, após conversar com Amorim. "Não concluímos nada, mas exploramos avenidas que nos levem ao relançamento da Alca", completou o ministro brasileiro.

O primeiro passo concreto será uma reunião entre os embaixadores Adhemar Bahadian, encarregado da Alca no Itamaraty, e Peter Allgeier, o segundo de Zoellick. São co-presidentes da Alca e devem discutir como retomar o processo que envolve 34 países - as Américas menos Cuba. Mas a conversa, marcada para o dia 23 em Washington, "ainda será muito preliminar", disse Bahadian.

Dois pontos fizeram empacar as negociações, segundo Bahadian. Os americanos, explicou, abandonaram a idéia de completa liberalização comercial em três etapas - imediatamente, em 5 anos e em 10 anos - e restabeleceram a noção de que certas barreiras seriam mantidas para alguns produtos agrícolas. Os brasileiros continuariam a enfrentar dificuldades para levar ao mercado americano produtos importantes, como suco de laranja, açúcar e fumo.

Em segundo lugar, continuou Bahadian, os americanos insistiram em adotar na Alca regras de propriedade intelectual mais limitantes que as da Organização Mundial do Comércio (OMC). Segundo ele, foi um recuo em relação ao combinado em Miami, no fim de 2003, na tentativa anterior de relançar as negociações.

Pela proposta americana, violações do direito de propriedade seriam puníveis com retaliações comerciais. Se, por exemplo, os EUA julgassem insuficiente o combate à pirataria no Brasil, teriam pretexto para impor barreiras à importação de um produto agrícola. É a chamada "retaliação cruzada", considerada inaceitável pelo governo brasileiro. Na prática, segundo Bahadian, seria principalmente uma forma de atender à indústria farmacêutica americana, dificultando a produção de genéricos, protegida por acordo na OMC.

ÇQuanto à proposta brasileira de uma negociação entre Mercosul e EUA, já havia sido apresentada em 2003, mas sem resultado até agora. Segundo Amorim, essa negociação seria concentrada no comércio de bens e cuidaria essencialmente de acesso a mercados. Outros temas, como regras, serviços e compras governamentais, seriam discutidos coletivamente na Alca.

Zoellick também pediu a Amorim comentários e informações sobre América Latina e Caribe. Venezuela, Haiti e Colômbia foram alguns dos temas discutidos, segundo o ministro brasileiro.