Título: Boletim já é dispensado em casos extremos, afirma médico
Autor: Lisandra Paraguassú,Mariangela Galluci
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2005, Vida &, p. A14

O presidente da Comissão Nacional de Violência Sexual e Interrupção de Gestação da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), Jorge Andalaft Neto, vê a norma do ministério como positiva. "O boletim de ocorrência não pode ser um obstáculo para a mulher exercer seu direito", afirmou o médico. "E se ela não quiser comunicar o crime por ter sido ameaçada ou algo do tipo?" Ele acredita que a ausência do BO não fará com que mulheres que não foram vítimas de estupro tentem fazer aborto num dos 46 hospitais brasileiros autorizados. "Elas procuram clínicas clandestinas. Não tentam o serviço público." Além disso, diz, as equipes de médicos, psicólogos e assistentes sociais sabem diferenciar a mulher que sofreu estupro das demais. "Eu trabalho há 15 anos com isso. A vítima é diferente."

No Hospital Municipal Arthur Ribeiro de Saboya, no Jabaquara, zona sul, uma das instituições autorizadas, o número de mulheres que procuram o serviço é pequeno: cerca de 20 por ano. "Sugerimos que elas procurem a delegacia. Mas, em situações muito especiais, não exigimos o boletim de ocorrência, como deficiência mental ou ameaça de morte. Há uma discussão com uma equipe, porque não se pode exigir que uma deficiente vá até a delegacia e as ameaçadas têm muito medo do agressor", diz.

De acordo com o médico, há sempre uma avaliação multiprofissional. "Toda mulher que vai se submeter a uma interrupção de gravidez passa pela psicóloga, pela assistente social e por exames. Ela também assina um documento declarando que todas as informações fornecidas são corretas. Se não forem, ela se responsabilizará até judicialmente."

De acordo com Osmar Colás, do Programa Saúde da Mulher da Secretaria Municipal de Saúde, apesar de oito instituições fazerem parte do Programa Aborto Legal na capital, o hospital do Jabaquara realiza 90% dos procedimentos do município. "São mais de 300 abortos feitos desde 1989 no estabelecimento. Todos enquadrados na lei", afirma.