Título: Arrocho fiscal atinge 4,63% do PIB
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/01/2005, Economia, p. B7

O arrocho fiscal aos quais os ministérios do governo Lula estão submetidos já é 50% maior do que o da administração Fernando Henrique Cardoso. De acordo com os balanços das contas públicas dos últimos seis anos, a contribuição do Tesouro Nacional para o superávit primário (economia necessária ao pagamento dos juros) de 2004 atingiu 4,63% do Produto Interno Bruto (PIB), frente a uma média de 3,05% entre 1999 e 2002. A economia realizada pelo Tesouro é dada pela diferença entre todas as receitas e despesas realizadas pelo governo federal, exceto as da Previdência Social. Ou seja, só não entram na conta o gasto com benefícios pagos pelo INSS e o dinheiro arrecadado com as contribuições previdenciárias dos trabalhadores e patrões.

No ano passado, por exemplo, as receitas do Tesouro somaram R$ 328,7 bilhões, dos quais R$ 67,6 bilhões foram transferidos a Estados e municípios, sobrando R$ 261,2 bilhões para a União. Desse total, R$ 81,7 bilhões foi utilizado para pagar os juros da dívida pública e cobrir o déficit da Previdência.

De acordo com integrantes da equipe econômica, esse resultado surpreendente mostra que o governo não esmoreceu no ajuste fiscal, como opinam alguns analistas do mercado. A carga tributária recolhida pelo Tesouro cresceu de 2003 para 2004, mas está praticamente empatada com o patamar de 2002, enquanto as despesas discricionárias - incluindo investimentos e custeio da máquina - e com pagamento de servidores estão abaixo.

"Continuamos firmes no compromisso de manter o superávit primário em um nível necessário à redução da relação da dívida e o PIB", afirma o ministro do Planejamento, Nelson Machado.

Segundo ele, alguns gastos públicos - principalmente os de natureza social - cresceram, mas nem todos por decisões tomadas no governo Lula, como o aumento real do salário mínimo. "Este é um ato que decorre da vontade política do presidente, mas outros foram produzidos por definições anteriores, como o Estatuto do Idoso." Em proporção do PIB, a economia de recursos feita pelo Tesouro em 2004 supera a meta de superávit primário de todo o setor público (4,5% do PIB). Mesmo quando subtraímos o déficit recorde da Previdência (R$ 32 bilhões ou 1,81% do PIB), ainda sobra um saldo de R$ 49,7 bilhões de superávit no governo federal. Em 2002, esse superávit havia sido de R$ 32,5 bilhões.

Em termos reais, isso significa que o governo federal gastou em 2004 R$ 7,2 bilhões a menos do que no último ano de gestão do ex-presidente, mesmo quando incluímos no cálculo as despesas da Previdência, que cresceram muito desde 1999, passando de 6,01% do PIB para 7,13%. As despesas de natureza assistencial - muitas delas obrigatórias - também cresceram muito nos últimos anos.

O pagamento do abono salarial e do seguro-desemprego, por exemplo, custou no ano passado R$ 9,5 bilhões, atingindo o maior nível da história (0,54% do PIB), apesar da recuperação econômica. O mesmo correu com os benefícios pagos a idosos e portadores de deficiências, regulamentados pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS).

RESTRIÇÕES

Machado reconhece que essa situação fiscal, aliada ao compromisso do governo Lula com o gasto social, continua sendo um forte limitador ao aumento dos investimentos federais em infra-estrutura, que ainda estão abaixo dos registrados na gestão anterior. Mas Machado argumenta que o governo pretende driblar essas restrições com programas de qualificação dos gastos e por meio de parcerias com o setor privado.

"Nossa linha tem sido buscar novas formas de financiamento, mobilizando os capitais privados para as concessões públicas e para as PPPs", diz o ministro. O projeto piloto em negociação com o Fundo Monetário Internacional (FMI), lembra Machado, também permitirá um aumento de R$ 2,8 bilhões em investimentos durante o ano de 2005. Esse volume de gastos em projetos especiais não será contabilizado no cálculo do superávit primário devido a uma perspectiva de que pode alavancar o crescimento da economia e, assim, ajudar a reduzir o nível de endividamento.