Título: O luxo e a glória que ficaram no passado
Autor: Mariana Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/03/2005, Economia, p. B12

Quando completou 50 anos, em 1977, a Varig exibia títulos assombrosos. Era a maior empresa privada brasileira, a maior empresa aérea privada fora dos Estados Unidos e, comparada às 11 maiores empresas aéreas americanas, ficava em segundo lugar em rentabilidade. Comparada às maiores do mundo, ficava na quinta posição. Nessa época, a Varig voava em velocidade de cruzeiro, dominando o mercado aéreo brasileiro, com mais da metade dos vôos domésticos e praticamente 100% dos internacionais. À frente da empresa não havia nenhum sinal da louca montanha russa financeira que chacoalharia a companhia a partir da década de 90. Nos últimos dez anos, a empresa, com seus prejuízos contínuos, tornou-se só uma sombra do que foi no passado.

"A Varig enfrentou dois problemas sérios, um de raiz econômica, com congelamento de tarifas, crise cambial e altas taxas de juros, e o outro de natureza competitiva", avalia André Castellini, sócio e analista em aviação da consultoria Bain&Company.

"A Varig sempre foi uma empresa monopolista, que não soube avaliar direito a concorrência. Subestimou concorrentes, que julgava inferiores, como a TAM, e, mais recentemente, a Gol." A Varig, segundo o analista, também foi vítima do mesmo mal que acabou com empresas gigantescas do passado, como a PanAm e TWA: a falta de eficiência.

Fundada por um imigrante alemão no Rio Grande do Sul, a Varig foi a primeira empresa aérea brasileira. Seu primeiro vôo, realizado num hidroavião alemão Dornier-Wall batizado como Atlântico e com capacidade para nove passageiros, ligava Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande. Em 1942, fez o primeiro vôo internacional, entre Porto Alegre e Montevidéu.

Mas o grande salto viria treze anos depois, em 1955, quando a Varig inaugurou a primeira ligação entre o Brasil e Nova York, com o avião Lockheed Super Constellation. Esse vôo inaugurou a era das viagens de luxo na Varig. Os aviões tinham mordomias como mesas de carteado, poltronas reclináveis como as das classes executivas de hoje e até janelas panorâmicas.

Em pouco tempo, Varig dominou a ligação entre a América do Sul e Nova York com um vôo que ia até Montevidéu e Buenos Aires. Uma concorrente sua, a Real, usava aviões parecidos na ligação com os países andinos, México e Los Angeles. A PanAir, outro dinossauro da aviação nacional, voava entre Brasil e Europa.

EXPANSÃO POLÊMICA

Na década de 60, tomada de uma fúria expansionista e com a ajuda do governo federal, a Varig absorveu, de forma polêmica, a Real e a PanAir, seus funcionários e linhas. Passou a ser a grande potência da aviação brasileira, com vôos para a Europa, Estados Unidos, Japão e América do Sul.

Na época, já operava com jatos como o Caravelle e o Boeing 707 - o Sucatão que servia à Presidência da República é um fóssil voador dessa época. Depois foi a vez de engolir a Cruzeiro do Sul, em 1975.

A Varig tornou-se referência internacional de conforto e qualidade, padrão que hoje já não consegue manter. Foi a única empresa brasileira a ter Jumbos, os Boeing 747, na frota. Nos anos 80, chegou a ter 30 mil funcionários.

Além de um serviço de produção de refeições e manutenção excepcionais, até o início dos anos 90 fazia coisas inimagináveis para uma companhia aérea. Tinha uma divisão para esterilizar fones de ouvido usados nos aviões e outra para montar monitores, terminais e impressoras de computadores.

Pouco desse brilho sobrou hoje, com as passagens de aviões transformadas em commodities. "A Varig perdeu espaço no mercado doméstico, o mais rentável, e sem isso começou a ter sérias dificuldades para manter sua pesada estrutura internacional", diz Castellini, da Bain&Company."É uma empresa que não suporta mais manter disputas tarifárias de forma sustentável."