Título: Rota do relógio falso passa por NY
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/01/2005, Economia, p. B8

Apesar de o governo americano insistir em se queixar da pirataria no Brasil, até mesmo com ameaças de retaliações comerciais, os produtores de relógios da Suíça alertam: a região de Nova York faz parte da rota dos relógios de marca falsificados que terminam nas ruas das capitais brasileiras. Em entrevista ao Estado, o chefe do serviço de combate à falsificação da Federação de Produtores de Relógios da Suíça, Michel Arnoux, afirma que a América do Sul está se tornando o maior mercado de relógios falsificados do mundo e existem mais produtos falsos que originais à venda. A Suíça é um dos maiores exportadores de relógios e o setor é considerado estratégico para a economia local. A primeira produção foi estabelecida em Genebra no século 16. Com a reforma religiosa iniciada por Calvino, o uso de jóias foi banido e os artesãos foram obrigados a buscar uma nova profissão: a de relojoeiro.

Hoje, além de novos concorrentes na Ásia, os produtores suíços acusam a falsificação de provocar perdas significativas. "Já existem 40 milhões de relógios falsificados produzidos todos os anos no mundo, enquanto a fabricação de originais não passa de 25 milhões", diz Arnoux. Segundo ele, os prejuízos já equivalem a 25% das exportações anuais do setor, que chegaram a cerca de US$ 8 bilhões em 2004. "A falsificação se tornou um enorme problema", diz o representante da indústria.

Depois de estudos e investigações, os produtores identificaram a rota dos relógios falsificados. "A maioria dos produtos é fabricada na China. Apenas em 2004 conseguimos dar informações para que a polícia chinesa fizesse uma apreensão em 200 pequenas fábricas, com cerca de 1,5 milhão de unidades", afirma Arnoux. Ela conta que a fabricação atual não tem nenhuma relação com métodos artesanais usados pelos falsificadores do passado. Hoje, são unidades de produção organizadas e com estratégias comerciais.

Da China, os produtos, ainda sem levar o nome de marcas famosas como Rolex, Ômega e outras, seguem legalmente para os Estados Unidos. "Sabemos que é na região de Nova York que esses relógios ganham suas etiquetas e de lá saem para serem distribuídos para toda a América Latina. Não sabemos onde estão essas produções, mas acreditamos que esse trabalho esteja sendo feito graças aos contatos da colônia chinesa, que é bem organizada nos Estados Unidos", acusa Arnoux.

"Parte da distribuição para a América Latina é feita por caminhões, que cruzam a fronteira com o México e seguem para a América Central. Já outra parte, principalmente para a América do Sul, vai de navio. Só em 2004 conseguimos identificar três carregamentos para o Brasil. Não eram apenas sacolas de relógios falsificados. Eram contêineres com toneladas de produtos. Essa é uma prova de que os grupos criminosos estão apostando no Brasil como importante mercado."

Com falta de ação da polícia e uma presença física ainda reduzida das empresas suíças na América do Sul, Arnoux acusa a região de ser uma "terra de ninguém". Ele admite, porém, que o Brasil vive situação um pouco melhor que alguns de seus vizinhos em termos de atuação do governo.

"As autoridades do País, inclusive nas aduanas, estão cada vez mais conscientes da importância do tema e estão cooperando. Mesmo assim, a América do Sul é a região que mais deve sofrer um aumento da venda de produtos falsificados nos próximos anos", completa, sem conseguir dizer o volume de relógios falsos que estariam sendo vendidos por ano nos mercados sul-americanos. Curiosamente, a região não conta com um país sequer entre os 30 principais destinos dos relógios originais produzidos pelos suíços.