Título: EUA agüentam taxas mais altas
Autor: Alberto Tamer
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/02/2005, Economia, p. B9

A economia americana agüenta uma alta até mesmo mais acelerada dos juros. Esta é conclusão de 90% dos analistas do mercado financeiro e institutos de pesquisa, mesmo antes da reunião do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Nos EUA há um otimismo muito próximo da euforia com a divulgação de dados que apontam um crescimento de no mínimo 3,6% para este ano. Isso após 4,4% em 2004. O crescimento, dizem, vem sendo fortemente sustentado pelo setor imobiliário privado e oficial. Pesquisa feita pelo jornal US Today entre 58 dos principais economistas americanos chegou à conclusão de que esse crescimento não deverá pressionar a inflação, prevista em 2,4%. Isso se deveria não só ao aumento da produtividade, que está, agora, se estabilizando, mas ao fato de que, mesmo com aumentos graduais, os juros praticamente se equilibram ou são só um pouco mais altos que a inflação. Isso é um fator de estímulo ao consumidor, principalmente do setor imobiliário, da construção civil, altamente financiado por até 30 anos com taxas baixas e reajustáveis. A pesquisa mais importante foi feita pelo Instituto dos Gerentes de Compra, que registrou um aumento considerável da expansão do setor de manufaturas dos EUA, acompanhado pela tendência de criação de mais empregos. "Os resultados de janeiro apontam para uma forte expansão da demanda não só interna, mas também voltada para as exportações", diz Norbert Ore, presidente do Instituto. Das 20 maiores indústrias consultadas, 12 registraram o maior crescimento, maior lucro e mais reinvestimentos.

CONSTRUÇÃO SUSTENTA O PIB

Por que esses setores? A resposta foi dada pelo próprio Departamento do Comércio. Ele revela que os gastos no setor de construção civil, casas, apartamentos, moradias, em geral, registrou crescimento de 1,1% em dezembro. O mercado esperava uma expansão de 0,5%. Anualizadas - dezembro a dezembro -, as aquisições de imóveis, inclusive comerciais, mobilizaram US$ 1 trilhão. É o melhor resultados nos últimos quatro anos. E isso apesar dos últimos aumentos dos juros, que não assustaram os candidatos à compra de imóveis.

"EXUBERÂNCIA IRRACIONAL?"

Este não é um fenômeno novo. Nos dois últimos anos o setor imobiliário vem sustentando a recuperação do PIB, o que já levou alguns economistas mais prudentes a falarem em "exuberância irracional" no crescimento do setor de construção, comparando-o com a bolha do mercado de ações, em 1996.

Mas há uma diferença entre ações, volúveis, altamente líquida, especulativa, que geram riqueza (ganhos financeiros), mas não empregos diretos, e construção civil. Esta é altamente absorvedora de mão-de-obra e consumidora de matérias-primas e produtos manufaturados. Acrescentem-se a isso todos os desdobramentos positivos que embute. Aqui não se trata só de construir uma casa ou levantar um prédio de apartamento, mas também da aquisição de móveis e outros bens manufaturados. Somando os gastos com todos os produtos, desde o início da obra até sua conclusão e habitação final, o setor responde por cerca de 5% do PIB e não apenas os pouco menos de 1% (US$ 1 trilhão) despendidos na construção, no ano passado.

Para os que falam na "exuberância irracional" na construção civil, que, ao contrário da outra "exuberância", tanto agrada a Greenspan, há uma novidade. "Nos últimos meses surgiu um fato novo neste setor. Está havendo uma virada para a construção de imóveis comerciais. Estamos prevendo para 2005 um mercado na construção de hotéis muito aquecido", afirma Ken Simonson, economista-chefe da Associação Geral de Construtores Civis.

E O DÉFICIT?

Esta era uma outra pergunta que ocupava um segundo lugar na preocupação não só dos economistas, como do Fed. Seus economistas se concentram muito no "déficit comercial". O Fed contradiz a idéia de que a redução do déficit fiscal do governo, levaria a um resultado semelhante no déficit comercial. E cita dados oficiais do ano fiscal de 2004. O déficit comercial ficou acima de US$ 600 bilhões, mais de 5% do PIB, e o déficit fiscal de 2004 foi de US$ 412 bilhões, 3,6% do PIB. Curioso é que o estudo feito pela equipe do Fed é independente do que Greenspan pensa e pode não representar o pensamento do seu presidente. Trata-se de uma análise suplementar. Eles concordam que um aumento excessivo do déficit comercial, paradoxalmente acompanhado pela desvalorização do dólar, pode fazer que os países (China, Japão) se tornem mais arredios no financiamento do déficit fiscal americano. Mas, concluem, são dois fatos que devem ser analisados separadamente. É o déficit comercial, que precisa ser atacado, e ele decorre da relativa desacelaração dos parceiros dos EUA. Não absorveram uma parte importante da produção americana, que crescem não só pela demanda de produtos nacionais, mas importados também.

Resumindo, ou há maior equilíbrio nas economias dos principais parceiros, ou o déficit comercial continuará aumentando acima até do déficit fiscal. Para este ano, alguns analistas mais ousados estão prevendo que o déficit comercial dos EUA pode chegar a US$ 780 bilhões. Se isso se confirmar, "teremos um problema..."