Título: Greenhalgh põe negócios à parte
Autor: DORA KRAMER
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/02/2005, Nacional, p. A6

Partindo de um pressuposto irrefutável - respeito é bom e todo mundo gosta -, o candidato oficial do PT à presidência da Câmara, Luiz Eduardo Greenhalgh, faz seus planos com a certeza de que, se eleito, terá apoio no governo, na oposição e na sociedade para iniciar uma reforma de procedimentos no Legislativo - na opinião dele, hoje muito submisso ao Executivo e distante do cotidiano do Brasil real. Um Parlamento "respeitável", inserido na agenda da sociedade, cuja atuação se direcione cada vez mais para o exercício da política e menos para a defesa de interesses pessoais, é, na concepção de Greenhalgh, uma demanda coletiva e, portanto, exeqüível. "Acho perfeitamente possível estabelecer um diálogo de igual para igual com o governo sem que isso se traduza em conflito ou seja interpretado como um elogio à divergência. Ao contrário, trata-se de seguir o preceito constitucional da independência entre os Poderes da República", diz ele. Como discurso, soa bonito. Mas, admitindo-se que seja ele mesmo, candidato governista, o próximo presidente da Câmara, não ficaria devendo essa (eleição) ao Palácio do Planalto onde prevalece sempre - seja quem for o inquilino - a noção do dever de obediência, valor especialmente caro ao centralismo do PT? "Evidentemente não serei oposição ao governo nem vou gerar crises; não apago minha biografia, mas também não perco de vista que o Parlamento é um espaço plural." E se as circunstâncias o obrigarem a uma escolha de Sofia? "Numa situação-limite, fico presidente da Câmara." Antes que a criatura cética sentada à sua frente verbalize a dúvida, Luiz Eduardo Greenhalgh, apresenta as provas. "Na Comissão de Constituição e Justiça (que presidiu durante o primeiro ano de governo Lula) o Planalto quis escolher os relatores, sugerir supressão de prazos regimentais e evitar a realização de audiências públicas durante a tramitação das reformas tributária e da Previdência." Greenhalgh relembra ter resistido à tentativa de "enquadramento", então muito em voga na Casa Civil da Presidência, sem que isso resultasse em prejuízo ao Palácio do Planalto. "O governo teve as reformas aprovadas, mas de acordo com o regimento da Câmara, e não segundo as regras de sua vontade. Percebeu a diferença? Vai ser assim." Caso seja eleito, bem entendido, pois, se as coisas para o lado do candidato oficial já estiveram bem piores - antes de o governo se convencer de que a derrota dele é a derrota de Lula -, digamos que a escola ainda não seja nem de longe risonha e franca para ele. Tanto que o carnaval de sua excelência será em Brasília mesmo, tendo por companhias o telefone e o poder de convencimento. Tido como esnobe - "nada, sou é discreto" -, Greenhalgh tem vivido ultimamente em função da arte de fazer amigos e influenciar pessoas. Dá duro dia e noite para ganhar no primeiro turno, "de segundo turno ninguém gosta". Principalmente candidato com quatro oponentes, todos potenciais cabos eleitorais do adversário na etapa final. Ainda mais candidato governista meio deixado de lado pelos companheiros ministros - "se fosse esperar para começar a campanha estava frito" - e a desvantagem de um ambiente algo hostil em relação ao Planalto. "Tenho meus defeitos, mas os problemas da candidatura existiriam para quem quer que fosse o candidato oficial." Na opinião dele, as resistências expressam o contencioso acumulado entre o governo e sua base parlamentar nestes últimos dois anos, além de traduzir também o desgaste na sociedade. O governo, então, atrapalha por causa dos erros na relação com o Congresso? Há momentos em que Greenhalgh fica mudo, mal respira. Nitidamente dividido entre o ímpeto da franqueza e a necessidade de se eleger presidente da Câmara daqui a dez dias. Por isso também não gosta de descer a detalhes quando o assunto é aquele rol de razões pelas quais a opinião pública não tem do Parlamento uma imagem exatamente "respeitável" como a idealizada pelo candidato petista. Quais sejam, aumentos de salários, vantagens a mancheias, semana de parcos dias de trabalho, recessos longos, convocações extraordinárias sustentadas a ouro e mirra, sem contar a perda de tempo com votações de interesse corporativo. Greenhalgh não dá sinal de vida - mantém imóveis das sobrancelhas ao bigodão - quando lembrado de que a Câmara no ano passado gastou parte do tempo discutindo aumento de vagas para vereadores, parte girando em torno do fracassado plano de reeleição do atual presidente, João Paulo Cunha. Abrir a boca mesmo, só para manifestações do bem. A respeito dos aumentos de salários e provimentos de gabinetes que anda prometendo, faz um reparo: "Prometo é tirar os temas da clandestinidade, fazer o debate à luz do dia e dividir responsabilidades." Sobre recessos, convocações, semanas encurtadas, para tudo isso tem idéias. Mas prefere apresentá-las quando, e se, instalado no gabinete da presidência. Quanto ao excesso de medidas provisórias, o candidato do governo não difere da maioria; por abundantes, trata as pobres como pragas e faz delas motivo de zombaria: "A Câmara não é a faxineira do governo para viver limpando a pauta obstruída pelo Planalto."