Título: Atraso na definição da reforma atrapalha governo
Autor: João DomingosChristiane Samarco
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/03/2005, NACIONAL, p. A7

A demora na definição da reforma ministerial por parte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva começa a pôr em risco a governabilidade e as finanças públicas, dizem aliados importantes do governo, tanto nos partidos quanto em entidades como a Confederação Nacional da Indústria (CNI). "A descoordenação política que se verifica hoje representa um perigo para o País, para o governo e para a democracia", avalia o presidente da CNI, deputado Armando Monteiro Filho (PTB-PE). Armando Monteiro lembra que, por falta de coordenação política, o governo sofreu duas derrotas arrasadoras e perigosas para o equilíbrio financeiro do País nos últimos sete dias. Primeiro, ao permitir que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovasse projeto que baixou a idade mínima para que os idosos sejam incluídos no cadastro da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas), o que representará só neste ano um rombo de R$ 15 bilhões; segundo, por não ter ninguém na Mesa Diretora da Câmara nem um líder que pudesse ter impedido o reajuste de 25% para as verbas de gabinete, o que significará aumento de gastos de R$ 58,9 milhões.

Mas não é só isso. Por causa da descoordenação e da falta de uma pessoa que negocie em nome do Palácio do Planalto no Congresso, o governo está a perigo também na parte política. "Num dia só o Congresso abriu três CPIs perigosas e aprovou aumento para verba de gabinete dos deputados. É o caos", diz Antônio Augusto de Queiroz, cientista político que atua no Congresso há mais de 15 anos, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).

O descontrole na coordenação é tão grande que na noite de quarta-feira, ao votarem a emenda constitucional que mudou as regras da Previdência Social (conhecida por PEC paralela) não havia um único negociador do governo nesta área a quem os partidos da base aliada pudessem recorrer. O líder Professor Luizinho (PT-SP) atua como se já estivesse substituído e ninguém gosta de negociar com moribundos. O ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, aguarda demissão.

Seu colega da Previdência, justamente ele, que deveria estar no Congresso, o senador Amir Lando (PMDB-RO), já foi demitido.

Pior, não pelo presidente Lula, mas pelo também colega Aloizio Mercadante (PT-SP), encarregado de lhe dar a má notícia. "Aquilo foi uma temeridade. A Câmara votou a reforma da Previdência às cegas", diz o deputado Ivan Valente (PT-SP).

Quem acabou salvando o governo foi o vice-presidente da Câmara, José Thomaz Nonô (PFL-AL), que estava no comando dos trabalhos. Quando faltavam três votos para a aprovação de emenda que devolvia às pensões e aposentadorias de servidores a integralidade retirada pela reforma de 2003, Nonô encerrou a votação. Se essa tivesse passado, o rombo imediato seria de R$ 14 bilhões.

A descoordenação política motivada pela falta de decisão do presidente Lula incomoda demais os aliados políticos. "As lideranças formais deste Congresso acabaram. Todos os governos dos quais participei cumpriam os compromissos assumidos, tanto que o PTB apoiou o governo Fernando Henrique durante oito anos, sem ministério. Mas esse não cumpre e ainda vaza para a imprensa as promessas que faz para os partidos, desgastando-nos com a própria bancada", diz o deputado Roberto Jefferson (RJ), presidente nacional do PTB. "Tá todo mundo infeliz com a forma como o governo vem tocando a reforma", acrescenta o líder do PT, José Múcio Monteiro (PE).

Para o líder do PP, José Janene (PR), o governo tem culpa pela instalação de três CPIs simultâneas no Congresso, porque não teve mobilidade para impedi-las. São duas no Senado - uma para investigar a força que tinha no governo o ex-assessor parlamentar Waldomiro Diniz e outra para investigar as privatizações no governo de FHC -, além de uma na Câmara, para tratar da privatização no setor elétrico. Os líderes e ministros de FHC não permitiram a instalação de CPIs contra seu governo. Lula, até agora, também tinha conseguido evitá-las. Na reforma ministerial, fritou seus colaboradores e líderes, ficou sem referência no Congresso e vai ter de agora amargar três CPIs.