Título: Reformar o INSS
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Fonte: O Estado de São Paulo, 07/02/2005, Notas & Informações, p. A3

Os números finais do déficit do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em 2004, divulgados em 28 de janeiro, indicaram um desequilíbrio de R$ 32,7 bilhões, superando em R$ 700 milhões os R$ 32 bilhões mencionados, uma semana antes, pelo ministro da Previdência e Assistência Social, Amir Lando. Os dados evidenciam que o aumento das receitas, em 2004, não impediu o agravamento do déficit. E, que quanto mais tempo o governo levar para promover uma nova reforma no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), ou seja, na previdência dos trabalhadores do setor privado, maiores serão as transferências de recursos da União para o INSS.

O problema transcende o vulto do déficit do INSS - o maior da história, no ano passado, com um aumento de 14,1% em relação a 2003 -, refletindo-se diretamente na caixa do Tesouro. Para avaliar essa pressão, é interessante observar os dados do fluxo de caixa do INSS, em 2004. Segundo o Boletim Estatístico da Previdência Social, em dezembro, por exemplo, o Tesouro Nacional antecipou R$ 7,65 bilhões ao INSS. Ainda que antecipações sejam rotineiras - e, ainda mais, no mês de pagamento do 13.º salário aos aposentados -, o mesmo não se pode dizer do montante transferido ao INSS, que correspondeu a quase o dobro do superávit primário de R$ 3,988 bilhões obtido pelo Tesouro, naquele mês. Em 2004, outros dados mostram que o total das transferências de recursos da União para o INSS atingiu R$ 49,379 bilhões, mais, portanto, que o déficit previdenciário.

Ao explicar os números da Previdência Social em 2004, o secretário Helmut Schwarzer procurou enfatizar o aumento dos benefícios, da média de R$ 459,74, em 2003, para R$ 498,68, em 2004 (+8,5%), propiciado pelo bom comportamento das receitas. "O bom desempenho da arrecadação se deu, principalmente, pela melhoria do mercado de trabalho e pelo desempenho do Ministério da Previdência na recuperação de créditos, que cresceu 14,8%", disse Schwarzer.

Mas a questão central não é esta, e sim um problema que se repete nos últimos oito anos: as despesas do INSS crescem mais depressa do que as receitas. Esta tendência não deverá mudar, neste ano, quando o déficit está estimado em R$ 40,9 bilhões. E, em 2004, o déficit efetivo superou as projeções oficiais em 13%, ou seja, R$ 3,7 bilhões.

Há várias razões para justificar a previsão de um aumento do déficit de 1,81% do PIB, em 2004, para cerca de 2% do PIB, neste ano. A elevação do salário mínimo, de R$ 260,00 para R$ 300,00, acarretará despesa extra de R$ 1,8 bilhão, em benefício de 14,3 milhões dos 23,1 milhões de segurados. E não parece fácil uma repetição, em 2005, do crescimento do número de empregos formais registrado em 2004, de 1,5 milhão de vagas.

Velhos esqueletos continuam a rondar a Previdência: pensionistas estão obtendo ganho de causa em ações que pleiteiam a elevação dos seus benefícios, com base na Lei 9.032, de 1995. A norma assegurou aos pensionistas o mesmo valor do benefício pago ao aposentado, o que não ocorria. A Previdência calcula que mais de 550 mil pessoas serão beneficiadas, elevando as despesas anuais do INSS em R$ 1,3 bilhão. Outros esqueletos, como os atrasados relativos ao reajuste do salário mínimo de 1994, já representaram despesa adicional de R$ 3,1 bilhões, em 2004, segundo Schwarzer.

Como o déficit previdenciário é o segundo maior fator de pressão sobre as contas públicas (inferior apenas aos juros da dívida), cabe ao governo iniciar os estudos para uma nova reforma da Previdência. Mas, como alertou o especialista em contas públicas Raul Velloso, não bastará elevar a idade mínima de aposentadoria de homens e mulheres, em conseqüência do aumento da expectativa de vida, pois da caixa da Previdência saem também despesas assistenciais, como o pagamento de benefícios a 6,9 milhões de trabalhadores rurais que não contribuíram para o INSS. "Se essa situação continuar, não há como estancar o déficit", disse Velloso. Pode ser um tema indigesto num governo cujo presidente quer se reeleger, mas nem por isso é razoável escondê-lo sob o tapete.