Título: Brasil atrasa remédio por unidade
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/02/2005, Nacional, p. A5

Diante das reclamações da indústria e do comércio varejista, o governo decidiu retardar o calendário para a regulamentação da venda de remédios por unidades. Quando o decreto presidencial que liberou o fracionamento foi publicado, a idéia era preparar um projeto de regulamentação a toque de caixa e submetê-lo a uma rápida consulta pública. Mas os planos mudaram. Agora, antes de terminar o texto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) deve ouvir alguns representantes do setor e fazer alterações no projeto, antes mesmo de ele ser discutido em consulta pública. "Não recuamos. Só vamos ouvir o que comércio e indústria têm a dizer antes de finalizar o texto", ameniza o presidente da Anvisa, Cláudio Maierovitch. A polêmica surgiu logo após o decreto ter sido publicado. A indústria afirma que a venda fracionada pode representar um golpe fatal no sistema de controle de remédios, iniciado há alguns anos para evitar fraudes. Varejistas dizem que não há fiscalização eficiente no País para o sistema vingar e, sobretudo, que nem mesmo há farmacêuticos suficientes para trabalhar em todas as farmácias.

Os números, de fato, são apertados. Existem cerca de 60 mil farmácias no País e 90 mil farmacêuticos no mercado. É preciso considerar, no entanto, que parte dos profissionais atua na indústria farmacêutica e outros dedicam-se a atividades acadêmicas.

Não bastasse a gritaria, há pouco mais de uma semana representantes do comércio varejista ameaçaram não aderir ao sistema de venda de remédios por unidades. Maierovitch diz não se abalar com as reações. "Integrantes deste setor ficam apavorados com qualquer mudança de planos. Uma marola, por menor que seja, é vista como uma ameaça fatal."

A própria Anvisa admite que muitas das regras para a venda fracionada ainda precisam ser discutidas. Está certo que só farmácias credenciadas poderão adotar esse sistema de vendas. O farmacêutico ficaria encarregado de fazer o fracionamento e colocar a quantia requisitada numa embalagem - a princípio, plástica e lacrada - que teria uma etiqueta, com informações indispensáveis para o consumidor. "Um sistema semelhante ao que é usado nas farmácias de hospital", compara Maierovitch.

A venda fracionada foi sugerida pelo ex-assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Oded Gradjew, há um ano. Na época, Gradjew comentou que em outros países a medida era adotada com sucesso, e, no Brasil, poderia facilitar o acesso aos medicamentos. Desde o início, o presidente ficou entusiasmado. "Ele lembrou que a primeira-dama, Marisa, sempre reclamava do desperdício de dinheiro e das caixas com sobras de remédios nas gavetas", diz.

Pelo sistema, o consumidor pode comprar somente a quantidade de remédios necessária para o tratamento indicado pelo médico. A quantia tem de ser separada no momento da compra, por um farmacêutico.