Título: País perderá R$ 16 bi com juro alto
Autor: Patrícia Campos Mello
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/02/2005, Economia, p. B1

Elevação da taxa Selic desde setembro de 2004 reduz expectativas de crescimento do PIB brasileiro em até 1 ponto porcentual O aperto dos juros pode custar ao País até 1 ponto porcentual de crescimento, o que representaria perda de R$ 16 bilhões, considerando o Produto Interno Bruto (PIB) de 2004. Segundo economistas consultados pelo Estado, a elevação da taxa básica Selic - desde setembro, ela subiu 2,25 pontos porcentuais, e pode subir mais 1 ponto até março - reduz as expectativas de crescimento da economia em 2005. Grande parte dos economistas apostava em aumento de 4% no PIB brasileiro. Agora, muitos estão prevendo 3% ou 3,5% de crescimento. Parte dos analistas esperava que o Banco Central parasse de elevar os juros em dezembro, quando a taxa estava em 17,75%. Mas o Comitê de Política Monetária (Copom) voltou a elevar a Selic no mês passado, para 18,25%, e sinalizou em sua ata que as elevações vão continuar. "Achávamos que o País ia crescer 4% em 2005, o que seria um resultado muito positivo, dado que o ano anterior, 2004, foi muito forte", diz Luiz Guilherme Piva, economista-chefe da Trevisan. "Mas, com a elevação inesperada dos juros em janeiro e a sinalização de que continuarão subindo, estamos revendo nossas projeções para baixo."

Economistas, técnicos e diretores do Banco Central tentam decifrar os números e verificar se a economia vai continuar crescendo, se o aperto foi correto a ponto de conter a inflação sem sufocar o PIB, ou se já exageraram na elevação dos juros.

Para Rogério Mori, professor da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas, a elevação dos juros foi "desnecessária" e atinge os dois vetores de crescimento da economia brasileira. Em 2004, segundo Mori, o Brasil cresceu por dois motivos: expansão do crédito e das exportações. Os juros altos ameaçam essas duas fontes de crescimento, diz.

A expansão do crédito começou com a queda de juros iniciada em 2003 e aqueceu principalmente a venda de bens duráveis e os investimentos. Daqui para frente, o ciclo de altas da Selic deve restringir o crédito e encurtar os prazos, atingindo essa fonte de crescimento. Já a outra fonte de aumento do PIB, o setor externo, sofrerá com o câmbio. Com o dólar baixo, diz Mori, o saldo comercial vai cair neste ano. E um dos "culpados" pela queda do dólar é, de novo, o juro alto. Muitos capitais especulativos têm entrado no Brasil em busca de retornos maiores proporcionados pelos altos juros, levando à valorização do real.

Para Celso Toledo, economista-chefe da MCM Associados, o BC deveria ter parado de elevar juros em dezembro. Daqui para frente, diz Toledo, a política monetária será muito eficaz para sufocar o crescimento e pouco eficiente para combater a inflação. "Estas elevações de juros têm efeito mais garantido sobre a atividade, mas o efeito sobre a inflação é menos claro." Ou seja, elevar a Selic pode não trazer a inflação para a meta de 5,1%, mas deverá causar desaceleração na economia.

Braulio Borges, economista da LCA Consultores, acredita que os juros começarão a cair em agosto e chegam ao fim do ano em 17%. Antes da alta da Selic do mês passado, Borges achava que a Selic encerraria o ano em 16%. Ele não alterou sua previsão de 4,1% de crescimento, mas deixou de rever para cima suas estimativas. Segundo Borges, a LCA ia mudar sua projeção de crescimento do PIB de 4,1% para 4,3%. O economista via sinais positivos, como o índice do confiança dos empresários e consumidores, e medidas de crédito habitacional e financiamento para quem tem nome sujo. "Achamos que isso ia aumentar o crescimento; mas aí veio a ata 'terrorista' e desistimos." O único jeito de o País crescer 4,3% seria a Selic não chegar a 19% neste ano, diz Borges.

Júlio Sérgio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), vai mais longe. Ele acredita que, caso mude a política monetária, o País poderia crescer até 5% neste ano, em vez dos 3,5% que ele projeta.

Para Piva, da Trevisan, a decisão de manter o aperto dos juros vem em péssima hora, porque há indicadores contraditórios. Dados recentes da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostram que a indústria já perdeu o ímpeto de crescimento no quarto trimestre do ano passado, o que é indicado por uma pequena alta nos estoques e pelo uso da capacidade instalada, que parou de crescer. Neste momento ambíguo, o ideal seria esperar pelos impactos do ciclo de alta de juros, que podem levar até seis meses para aparecer.

Já Dirceu Bezerra, sócio-diretor da consultoria Rosenberg & Associados, acha que os efeitos dessa nova alta dos juros só serão sentidos no ano que vem. Para ele, a raiz do problema é a meta de inflação. "Para uma meta de inflação irrealista, só mesmo juros de realeza", diz. "Para cumprir essa meta baixa, o governo vai precisar dar uma pancada de juros."