Título: Despesa subiu. Vem aí mais imposto
Autor: Lu Aiko Otta
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/02/2005, Economia, p. B4

Previsão é que novos gastos governamentais não equacionados somem R$ 12 bi e economistas recomendam: chamem o Everardo BRASÍLIA - Para quem acha que está pagando impostos demais, os economistas têm duas péssimas notícias: o governo terá de arrecadar mais este ano para fechar as contas, e decisões de gastos feitas em 2004 vão aumentar o volume de despesas obrigatórias, congelando a carga tributária no nível em que está, de tal forma que o governo não terá como reduzir a tributação sobre a sociedade. "Neste ano, há pelo menos R$ 12 bilhões em despesas novas que não estão equacionadas", afirma o economista e consultor Raul Velloso. Embora todas as despesas estejam devidamente cobertas por receitas no Orçamento de 2005, Velloso suspeita que nem toda a arrecadação que consta da peça orçamentária ocorrerá. Isso porque os parlamentares contaram com um crescimento econômico acima de 4% e com "receitas atípicas" para fechar a conta.

O economista fez então outro cálculo, partindo do pressuposto de que a receita de 2005 será suficiente para cobrir um crescimento das despesas conforme a inflação. O aumento dos gastos acima da inflação, acredita ele, não está solucionado. Foi assim que chegou aos R$ 12 bilhões. Para honrar essas despesas, o governo terá de arranjar dinheiro em algum lugar. "O ministro (da Fazenda, Antonio) Palocci precisará de ajuda, vai ter de chamar o Everardo (Maciel, ex-secretário da Receita)".

O governo terá dificuldades para resolver o problema se a opção for aumentar a tributação, diz o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola, da Tendências Consultoria Integrada. A última tentativa do governo, a Medida Provisória 232, transformou a carga tributária em um grande debate nacional. "O governo não apresentou um caso bem contado. Todo mundo vê que a arrecadação está crescendo, não há crise, então o questionamento é forte."

NO LIMITE

Velloso acredita que a saída não é aumentar a tributação pelas vias tradicionais. A resistência à MP deixa isso claro, avalia. "Vão ter de buscar uma saída à Everardo", disse. O secretário da Receita nos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso saía desse tipo de enrascada buscando estoques de tributos a recolher. Ele incentivava contribuintes a desistirem de ações na Justiça e recolherem impostos atrasados, oferecendo descontos em multas e juros.

Loyola não sabe dizer se, com a MP 232, o governo se deparou com um limite invisível imposto pela sociedade contra novos aumentos na carga tributária. O que lhe parece claro é que o assunto ganhou as ruas. E o mais preocupante, avalia ele, é que o governo tem cada vez menos espaço para fazer o caminho inverso e cortar a tributação - não porque o vírus da sanha arrecadatória seja resistente à troca de governos, mas porque há um conjunto de despesas fixas que não podem deixar de ser pagas, e elas estão crescendo. Assim, é impossível abrir mão de arrecadação. "O aumento de gastos obrigatórios que vem sendo feito tende a segurar a carga tributária no nível em que ela se encontra."

Para o professor Rogério Mori, da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, este quadro se estabeleceu porque o governo Luiz Inácio Lula da Silva manteve a prática de seu antecessor de expandir as despesas à custa de aumento na tributação. "No ano passado, tivemos um choque tributário. A elevação da Cofins foi uma violência." O principal problema para 2005, na avaliação de Loyola e Velloso, é a elevação do salário mínimo de R$ 260 para R$ 300. Não se questiona o mérito da medida, mas o impacto que ela terá no conjunto das contas públicas. Perto dele, os gastos com o avião novo para Lula ou com cartão de crédito corporativo do Palácio do Planalto são troco. O governo calcula que o novo mínimo elevará o déficit da Previdência para R$ 35 bilhões.

"As contas do INSS estão em franca deterioração", concorda Rogério Mori. "A trajetória das contas do INSS voltou a ficar insustentável, com o reajuste do salário mínimo, e a discussão sobre a necessidade de nova reforma volta à pauta." O governo também elevou gastos com pessoal em 2004, que produzirão impacto neste ano. Loyola reconhece que algumas carreiras do funcionalismo precisavam de reajuste e lembra que o governo FHC tampouco foi austero nesse quesito. "Mas houve certo exagero." Aumentos e contratações no funcionalismo são despesas que se incorporam à estrutura de gastos e não são facilmente "cortáveis".