Título: Subsídio dos EUA já resistiu a acordo
Autor: Patrícia Campos Mello
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/02/2005, Economia, p. B6

Estudo revela que os Estados Unidos aprofundaram o dumping em produtos agrícolas após entendimentos da Rodada Uruguai Os Estados Unidos intensificaram a prática de dumping de produtos agrícolas nos dez anos que se seguiram ao acordo agrícola da Rodada Uruguai da Organização Mundial do Comércio (OMC). Segundo estudo divulgado ontem pelo Instituto de Agricultura e Política Comercial, os EUA continuaram vendendo soja, milho, trigo, algodão e arroz bem abaixo do preço de custo até 2003. E o dumping aumentou significativamente desde 1996, quando foi introduzida uma lei agrícola no país. O dumping só é possível por causa dos subsídios pagos pelo governo aos produtores. Segundo o estudo "O acordo agrícola da OMC: Uma década de dumping", o acordo agrícola da OMC não beneficou os produtores. "Disseram que esses produtores iriam ter maior acesso para seus produtos e preços mais altos. Depois de dez anos, preços mais altos e mais justos para os agricultores estão mais longe do que nunca", diz o relatório.

A prática de dumping é nociva porque deprime os preços mundiais, prejudicando agricultores. Os produtores de países como EUA e os membros da UE recebem subsídios, seja na forma de pagamentos mínimos ou cheques complementares em épocas de baixos preços. Como têm esses pagamentos garantidos, os agricultores continuam expandindo a produção ou as vendas mesmo quando os preços estão baixos. Isso deprime ainda mais os preços. Se o mercado funcionasse sem intervenções, os fazendeiros reduziriam a produção quando os preços estivessem em baixa, o que levaria o mercado a se ajustar e os preços a subirem.

"Com os subsídios, o produtor continua produzindo no mesmo ritmo quando o preço cai e isso agrava a baixa cíclica do preço", explica Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Suínos (Abipecs). Para Camargo, o Brasil deveria deveria iniciar contenciosos questionando os subsídios à soja e ao arroz, a exemplo do que fez com o algodão e açúcar.

Segundo o estudo, em 2003 os EUA exportaram trigo a um preço 28% inferior ao custo de produção; soja e milho foram vendidos por 10% a menos do que o custo, algodão a 47% menos e arroz a 26%. Ainda de acordo com o relatório, os níveis de dumping aumentaram significativamente desde 1996, quando foi aprovada a lei Freedom to Farm nos EUA. Essa lei, seguida pela Lei Agrícola de 2002, produziu um excesso de oferta de bens agrícolas que deprimiu os preços. O nível de dumping do trigo subiu de 27% entre 1990 e 1996 para 37% entre 1997 e 2003. O nível de dumping da soja subiu de 2% por ano para 11,8%; o do milho subiu de 6,8% para 19,2%, o do algodão foi de 29,4% para 48,4% e o do arroz, de 13,5% para 19,2%.

O estudo sugere a eliminação dos subsídios às exportações e garantias dos países exportadores de manter fora do mercado internacional os produtos com preços abaixo do custo de produção. Segundo Marcos Jank, presidente do Icone, os EUA deram US$ 10 bilhões em subsídios agrícolas em 2004. Para ele, uma das poucas conquistas da Rodada Doha é a promessa da eliminação completa dos subsídios à exportação.