Título: Vinte e cinco anos do PT
Autor: José Genoino
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/02/2005, Espaço Aberto, p. A3

O PT chega aos 25 anos de existência na condição de um dos partidos mais fortes do Brasil. Com efeito, são cerca de 800 mil filiados e o partido governa o País, três Estados e 412 municípios e tem a maior bancada na Câmara dos Deputados. Nasceu enraizado nos movimentos sociais e se pode dizer que continua sendo o partido mais orgânico da sociedade.

Ao chegar aos 25 anos, o PT é alvo de várias críticas e caracterizações. Algumas delas são procedentes, mas a grande maioria se funda em pressupostos equivocados. Direitistas e esquerdistas, por exemplo, sustentam que o PT se deslocou para o centro de espectro político. Tomam como ponto de referência de suas análises o governo Lula. Trata-se, antes de tudo, de um equívoco confundir partido e governo.

O PT, pela sua tradição, pelos seus valores e pelos interesses políticos que procura representar, é e continuará sendo um partido de esquerda. A luta contra as injustiças sociais e contra a desigualdade e a defesa dos interesses dos movimentos sociais, dos setores mais pobres da sociedade e dos trabalhadores conferem ao PT uma constituição de esquerda. O valor da igualdade ocupa um lugar central no ideário do PT, sem prescindir dos valores da liberdade e do pluralismo, que o fazem também um partido radicalmente democrático.

O governo Lula, por ser um governo de coalizão, é, necessariamente, mais amplo que o PT. O que dita a caracterização do governo são as circunstâncias do nosso sistema partidário e institucional e a correlação de forças que brota da sociedade por meio das eleições. Aqueles que conhecem as lições dos clássicos da política e até mesmo dos teóricos tradicionais de esquerda sabem que a ação política deve fundar-se na realidade e levar em conta as condicionalidades impostas pelas circunstâncias. Querer governar o Brasil sem coalizões ou pretender implementar um programa que não leve em conta os interesses efetivos dos diversos grupos sociais significa apostar no fracasso.

O PT, de fato, sempre pregou a necessidade de mudanças. Mas o que significam mudanças democráticas e progressistas, com caráter de esquerda, no Brasil? No nosso entender, significam o aprofundamento da democracia e o combate à desigualdade e à pobreza por meio de um programa de desenvolvimento econômico e social que implique geração de emprego, distribuição de renda e ampliação das oportunidades de acesso ao bem-estar para os setores historicamente excluídos.

Não há como negar que esses são os objetivos centrais do governo e do PT e que é isso que o governo vem fazendo, na medida do possível, ao garantir a retomada do desenvolvimento, gerando quase 2 milhões de empregos em 2004. Os principais programas sociais, do Bolsa-Família ao ProUni, têm esta natureza de combate às desigualdades sociais. O cerne do programa de governo petista, ao propugnar pela retomada do crescimento com geração de emprego e distribuição de renda, e ao implementar projetos sociais distributivos, é de esquerda.

As críticas que são dirigidas ao governo e ao PT quanto à caracterização no espectro político se concentram nos aspectos periféricos do nosso programa e criticam os meios. Criticam, por exemplo, a política monetária, o superávit fiscal, o câmbio - meios usados para garantir a estabilidade da economia, reduzir o custo Brasil e implementar as condições do desenvolvimento. As críticas não atentam para o fato de que, combinados com esses meios estabilizadores, estão sendo adotados outros, desenvolvimentistas, tais como a política industrial, o comércio exterior, a desoneração dos investimentos, o acesso ao crédito, o incentivo à pesquisa tecnológica, o apoio à agricultura familiar, a reforma agrária, etc. No seu unilateralismo, os críticos transformam os meios em objetivos do governo e não conseguem perceber que, nos objetivos, o governo está colhendo êxitos. Não conseguem perceber que estabilização e crescimento constituem uma ambivalência necessária para o desenvolvimento sustentável e que é esta combinação, além dos objetivos, que marca a diferença fundamental do governo Lula em relação ao governo anterior.

Outro ponto importante pelo qual o PT vem sendo criticado diz respeito à exigência que sempre fez em torno da disciplina e da unidade partidárias. Ao contrário do que parece, esta exigência petista se funda no mais límpido pressuposto da democracia. Apelando novamente para os clássicos, estes sempre definiram a democracia, antes de tudo, como o governo das leis. Os partidos, assim como os Estados democráticos, são corpos coletivos, definidos por normas e por programas. Garantidos os direitos e as liberdades individuais, dentre os quais o mais importante é o direito de opinião, a relação entre filiados e partido está implicada numa injunção de deveres.

Sendo uma associação voluntária, o partido estabelece a preeminência do coletivo sobre os filiados e sobre as lideranças individuais. As definições partidárias decorrem da regra democrática da maioria e é necessário que sejam acatadas por todos. Sem isso não há partidos. Haveria apenas um agregado de indivíduos avulsos, promotores de seus interesses individuais ou de pequenos grupos. É contra esta ideologia do arbítrio individual, que tantos males causou à política brasileira, que o PT vem afirmando a primazia da instituição partidária em relação aos indivíduos filiados.

Sem essa primazia a democracia assentada nos partidos seria uma desordem. Os custos e as dificuldades de governabilidade se elevariam de forma exponencial. Por acreditar que o bom governo é um bem coletivo, o PT faz da luta pelas condições da garantia do bom governo uma atribuição de suas responsabilidades. Nas democracias, um dos pressupostos do bom governo é a existência de partidos fortes e disciplinados. José Genoino é presidente do PT