Título: Argentina insiste em sistema de salvaguardas
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/03/2005, Economia, p. B3

O governo do presidente Néstor Kirchner insistirá, mais uma vez, na exigência de que o Brasil aceite que o Mercosul tenha um sistema que evite aquilo que os diplomatas e industriais argentinos denominam de "desequilíbrios comerciais" dentro do bloco. Segundo o Secretário de Indústria e Comércio, Miguel Peirano, a recente contra-proposta do Brasil à proposta argentina de criação de um sistema de salvaguardas comerciais "não foi satisfatória". A exigência do governo Kirchner será reiterada na reunião bilateral brasileiro-argentina, que será realizada no dia 20 de abril.

O governo brasileiro, em fevereiro, entregou uma contra-proposta que sugere um sistema "temporário" de salvaguardas. Mas, essa idéia desagrada os argentinos, que exigem "mecanismos permanentes".

Peirano sustentou que o governo argentino voltará a apresentar as propostas originais, levadas à Brasília em setembro do ano passado pelo ministro da Economia, Roberto Lavagna. Nelas, o governo Kirchner propõe aplicar as salvaguardas de forma unilateral. Já os brasileiros prefeririam que a decisão de aplicação fosse bilateral.

Segundo Peirano, "a idéia é recriar as regras do jogo originárias, que foram a base do Mercosul, e tinham a intenção de desenvolver um comércio interno que permitisse o crescimento da indústria dos dois países e ganhar presença em terceiros mercados".

O secretário, ex-assessor da União Industrial Argentina (UIA), famoso pelas posições "duras" com o Brasil, declarou que "a Argentina não pode desistir de sua presença nos bens de maior valor agregado". Ele também considera que o Mercosul precisa contar com "regras claras para que os investimentos cheguem a todos os países de forma equilibrada".

Esta afirmação reforça a reclamação do governo Kirchner de que nos últimos anos a maior parte dos investimentos estrangeiros preferiram desembarcar no Brasil, e não na Argentina.

INVASÃO

Os empresários argentinos afirmam que diversos produtos Made in Brazil estão invadindo o mercado local, depredando as indústrias argentinas. Os empresários nativos, principalmente os que integram a UIA, alegam que diversos setores industriais brasileiros são favorecidos com subsídios irregulares, contra os quais os argentinos não podem competir.

Do lado brasileiro, os empresários negam a existência de subsídios e argumentam que não são responsáveis pela falta de competitividade da indústria argentina e, muito menos, pela falta de crédito no país.

Os pedidos protecionistas argentinos entraram em ritmo de escalada em meados de 2004. Na ocasião, o governo Kirchner aplicou medidas contra eletrodomésticos feitos no Brasil que vão desde a aplicação de licenças não automáticas a taxas alfandegárias extras. Além disso, por meio de ameaças de aplicar graves restrições, Kirchner forçou negociadores e empresários brasileiros a limitar as vendas para o mercado argentino através de aplicação de cotas.

Analistas afirmam que nos próximos meses, a atitude protecionista de Kirchner poderá se aprofundar, já que o presidente enfrentará decisivas eleições parlamentares em outubro. Uma posição "dura" com o Brasil poderá proporcionar votos a Kirchner, além de apoio entre setores empresariais.