Título: Copom diz que cenário externo vai determinar a trajetória do juro
Autor: Sheila D'Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/03/2005, Economia, p. B1

Enquanto os indicadores econômicos internos mostram que o fim do aperto monetário está próximo, o cenário internacional desponta como uma ameaça à inflação e à interrupção da alta nos juros. Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), divulgada ontem, os diretores da instituição se mostram dúbios em relação ao fim do processo de ajuste da taxa básica de juros, a Selic. Ao mesmo tempo em que ressaltam que a elevação iniciada em setembro já surte efeito nos índices de inflação e que o ritmo de crescimento do nível de atividade não está pressionando os preços, eles destacam que cresceram os riscos à convergência da inflação para a meta de 5,1% prevista para 2005. "A existência de alguns focos localizados de pressão na inflação corrente e a deterioração recente do cenário externo, com nova escalada nos preços do petróleo e maior incerteza acerca da condução da política monetária norte-americana, aumentaram os riscos a que estão sujeitas as perspectivas de convergência da inflação para a trajetória de metas", afirmam os diretores no documento.

Depois da análise na ata da reunião de fevereiro, o mercado financeiro esperava nova elevação em março, acompanhada da indícios de que a taxa ficaria inalterada por alguns meses, até se confirmar a trajetória de inflação desejada pelo BC. Somente no final do primeiro semestre ou início do segundo, apostava-se em queda dos juros. A alta da taxa se confirmou, com a elevação de 0,5 ponto porcentual na semana passada. Mas diminuiu a certeza de que esse foi o último aumento.

Segundo os diretores do BC, o aumento dos riscos no curto prazo dificulta a avaliação da evolução dos fatores que afetam os preços, a elaboração das projeções futuras de inflação e a coordenação, por parte do Copom, das expectativas de investidores e empresários em relação à trajetória da inflação nos próximos meses.

"Cabe à política monetária, portanto, manter-se especialmente vigilante para evitar que pressões detectadas em horizontes mais curtos se propaguem para horizontes mais longos", completam.

Assim, eles justificam a elevação da Selic para 19,25% ao ano e afirmam que vão "acompanhar atentamente a evolução do cenário prospectivo para a inflação até a sua próxima reunião, para então definir os próximos passos na estratégia de política monetária implementada desde setembro de 2004". Os diretores alertam ainda que estarão prontos para reagir e adequar "o ritmo e a magnitude" do ajuste em curso na taxa de juros às circunstâncias, caso o cenário piore ainda mais.

O aumento dos juros nos Estados Unidos tem repercussão sobre todas as economias, especialmente as emergentes, que precisam atrair recursos externos para financiar projetos de investimento e reforçar as reservas internacionais, compensando o impacto de pagamento das dívida externa.

Tanto é assim que os ruídos externos fizeram o risco Brasil subir e o real se desvalorizar anteo dólar. Por enquanto, a aposta do BC é que, mesmo com a volatilidade provocadas pelos comentários recentes do Fed (o BC americano) destacando preocupação com a inflação no País, não deverá haver uma deterioração brusca do cenário internacional.

Mas não é apenas a taxa americana de juros que pode complicar o desempenho da inflação no Brasil. O preço do petróleo no mercado externo voltou a subir desde meados de fevereiro, em resposta às informações disponíveis sobre demanda e estoque do produto nos principais países consumidores. Com isso, o valor da gasolina no mercado internacional está novamente acima do cobrado no Brasil. Como não se sabe se isso durará por muito tempo ou será revertido, o Copom manteve a previsão de que não haverá reajuste da gasolina no mercado interno este ano.

O problema é que, mesmo que o preço da gasolina não suba no Brasil, essa alta do petróleo se refletirá nos preços de insumos derivados do produto e nas expectativas dos agentes econômicos. Isso representa risco maior para o cumprimento das metas estabelecidas pelo governo, principalmente quando continuam subindo as projeções de inflação feitas por especialistas de mercado.

Para os diretores, o cenário doméstico está altamente favorável. A alta de 0,59% dos preços em fevereiro deveu-se a elevações pontuais de itens como mensalidades escolares. Por outro lado, o número de itens que sofreram reajustes caiu em relação aos meses anteriores. Depois de um período forte de expansão em 2004, o nível de atividade dá sinais de desaceleração, mas ainda mantendo a trajetória de crescimento.

A melhora no desempenho de setores como alimentos, vestuário e calçado reforçam a tese de que esse movimento é sustentado pelo aumento da renda da população. Uma preocupação que ainda persiste, porém, é com relação à elevação da capacidade produtiva da economia para atender à maior demanda por bens e serviços. A utilização da capacidade instalada da indústria ficou estável em janeiro mas ainda permanece em patamar elevado: 82,6%. Isso indica a necessidade de realizar investimentos para aumento do parque produtivo.

PETRÓLEO: A alta do preço do petróleo no mercado internacional poderá pressionar a inflação e desacelerar o ritmo de crescimento mundial.

JURO AMERICANO: O aumento das pressões inflacionárias causado pelo vigoroso crescimento econômico dos Estados Unidos e também pela elevação do petróleo tem despertado preocupação nos dirigentes do Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Para conter a alta dos preços, a instituição tem optado por aumentos graduais na taxa básica americana. Se isso não surtir efeito, o Fed poderá adotar uma postura mais agressiva de alta dos juros.

FUGA DE CAPITAL: Com os juros dos EUA elevados, os investidores reduzem suas posições em países emergentes, como Brasil, e compram papéis americanos

DÓLAR: A entrada menor recursos estrangeiros no País diminui a oferta de dólar, hoje depreciado em relação ao real

INFLAÇÃO: O dólar em patamares elevados tende a pressionar os índices de inflação, que também sofrem os efeitos da alta do petróleo

JUROS: Para conter os preços e garantir o fluxo de recursos, o BC eleva os juros e desacelera o ritmo de crescimento

PRESSÕES DE FORA