Título: O Brasil na França
Autor: Sergio Amaral
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/03/2005, Espaço Aberto, p. A2

2005 é o ano do Brasil na França. Isso significa que, de março a dezembro, o País estará presente nos espaços culturais mais prestigiosos ¿ Grand Palais, Louvre, Beaubourg, Musée d¿Orsay, Versailles e tantos outros ¿ em Paris e nas principais cidades francesas, com mais de 200 manifestações culturais, entre exposições de pintura e de fotos, dança e teatro, arte indígena e o barroco, muitos festivais de cinema e de música. Queremos mostrar a diversidade e a modernidade da cultura brasileira, a alegria do seu povo, a criatividade dos seus artistas. Mas pretendemos também aproveitar a oportunidade para chamar a atenção para a vitalidade de nossa economia, a qualidade de nossos produtos, a maturidade de nossa democracia e a determinação com que estamos enfrentando nossos desafios sociais.

Desde o início da preparação do ano do Brasil, a Embaixada está trabalhando com um sem-número de parceiros ¿ universidades, a Apex, a Embratur, as câmaras de comércio ¿ para lhe dar uma dimensão econômica. Assim, em 14 de abril, as câmaras de comércio franco-brasileiras organizam um colóquio econômico, para mostrar a diversidade dos investimentos franceses no Brasil, as novas oportunidades para a ampliação do comércio.

Um capítulo deste seminário será dedicado à presença crescente e oportuna de empresas brasileiras na França e ao interesse de parcerias empresarias, seja na França, seja no Brasil. O etanol, uma resposta inovadora à escassez de energia e às novas demandas do meio ambiente, também será evocado nessa ocasião.

No campo comercial, a Apex patrocinará a promoção e venda de produtos brasileiros em grandes lojas de departamentos ¿ Lafayette e Printemps ¿, assim como no Lafayette Gourmet e em supermercados como Casino e Carrefour. Estas mostras comerciais também terão lugar em Paris e nas principais capitais francesas.

Animações culturais nesses espaços comerciais darão a ambientação adequada para desfiles de moda e degustação de produtos. Por fim, haverá várias semanas gastronômicas, para tornar mais conhecida nossa culinária e a qualidade dos alimentos brasileiros.

A visita do presidente da República à França, por ocasião das solenidades de 14 de julho, marcará a excelência das relações franco-brasileiras, a convergência de nossas percepções do momento internacional e o nosso empenho comum em forjar instituições multilaterais mais representativas e efetivas.

Os primeiros resultados deste grande esforço ¿ coordenado pelos comissariados francês e brasileiro, com o apoio dos Ministérios da Cultura, das Relações Exteriores e da Secretaria de Comunicação ¿, possivelmente a mais ampla mostra da cultura brasileira no exterior, já se fazem sentir.

Importantes órgãos da imprensa francesa ¿ como Connaissance des Arts, Paris Match, Figaro, Le Monde, Elle, Les Echos, Télérama, Nouvel Observateur e Express, entre tantos outros ¿ dedicaram suplementos especiais ao Brasil, perfazendo uma circulação conjunta de quase uma dezena de milhões de cópias.

A televisão francesa dedicará mais de 30 horas de programação ao País, seu povo, sua cultura e sua economia.

A qualidade das manifestações culturais, a alta visibilidade do Brasil na mídia francesa, a presença de produtos industriais e agrícolas nas mais prestigiosas lojas e supermercados franceses trarão seguramente um impacto favorável para o intercâmbio econômico, especialmente no que diz respeito a um objetivo relevante, qual seja a consolidação da imagem de qualidade do produto brasileiro.

O Brasil realizou progressos notáveis em suas exportações nos últimos anos ¿ alcançamos a tão cobiçada marca de US$ 100 bilhões.

Mais importante do que isso, o porcentual do comércio exterior em relação ao PIB passou de 13% em 2001 a 26% no ano passado, um significativo avanço, mas que ainda nos deixa abaixo dos índices registrados por países comparáveis ao Brasil, como a Coréia, o México, a China e até a Índia (28%), conhecida por ser ainda uma economia relativamente fechada.

Temos, assim, um caminho a percorrer para ampliar a abertura da economia, agregar mais valor a nossos produtos e avançar um pouco mais nas etapas da cadeia produtiva.

Isto quer dizer comercialização, distribuição, marketing e imagem de qualidade do made in Brazil.

As diferentes iniciativas do ano do Brasil na França, no plano cultural e econômico, favorecem esses objetivos e mostram que cultura e comércio podem caminhar juntos, em benefício de ambos.

O ano do Brasil na França é, antes de tudo, o encontro de dois povos amigos, que sempre manifestaram interesse e afeto um pelo outro.

Comemora as muitas afinidades que se foram tecendo ao longo da História. Afinal, esta relação começou logo após o Descobrimento, quando índios brasileiros aportaram à França, provocando surpresa, curiosidade e os seguintes comentários de Montaigne: "Acho que não há nada de bárbaro e de selvagem nesta nação, salvo se cada um chamar de bárbaro o que não condiz com o seu costume" ¿ uma notável antecipação da tese da diversidade cultural, que defendemos juntos, brasileiros e franceses, nos principais foros internacionais.

A missão artística francesa de 1816 deixou valiosos registros artísticos sobre o Brasil à época de sua independência. Dom Pedro II manteve intensa correspondência com Pasteur sobre o progresso de suas pesquisas, particularmente em relação às enfermidades que afligiam o Brasil.

Foi, inclusive, um dos contribuintes para a criação do Instituto Pasteur. A República foi proclamada sob a égide do positivismo. A Universidade de São Paulo foi fundada com a participação de uma missão francesa, da qual fizeram parte, entre outros, Lévi-Strauss, Monbeig e Braudel. Ilustres brasileiros deixaram sua marca artística ou intelectual na França, como Villa-Lobos, Cícero Dias, Niemeyer ou Celso Furtado.

Hoje desenvolvemos intensa cooperação em quase todos os campos do conhecimento, compartilhamos percepções semelhantes sobre o mundo pós-guerra fria e trabalhamos juntos para que seja mais solidário e justo.

Não há dúvida que temos muito a comemorar por ocasião do ano do Brasil na França.

Sergio Amaral é embaixador do Brasil na França