Título: Palocci indica aumento de superávit . FORA FMI: O FIM DE UM CICLO
Autor: Sheila D'Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/03/2005, Economia, p. B4

Sheila D Amorim. BRASÍLIA. O Brasil não renovará o acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que termina nesta quinta-feira. A decisão, segundo o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, é resultado da melhora da economia brasileira e da redução da vulnerabilidade externa e não significa que o governo brasileiro está livre para gastar à vontade. "Não vamos fazer foguetório", afirmou ele, referindo-se à histórica desconfiança com que seu partido, o PT, vê o FMI. "É uma decisão madura do governo." À noite, em cadeia de rádio e TV, ele afirmou que a economia brasileira está em ordem e não precisa da ajuda do Fundo. O ministro reafirmou o compromisso com a disciplina fiscal e indicou que poderá até elevar a meta de superávit primário (resultado da diferença entre receitas e despesas, exceto gastos com juros) para este ano. Para que haja um maior controle das despesas de todas as esferas públicas, a equipe econômica irá, inclusive, estabelecer metas quadrimestrais para deixar claro quanto União, Estados, municípios e estatais estão economizando. Com a decisão de ontem, rompe-se o ciclo iniciado no final de 1998 e que permitiu ao País contar com quase US$ 80 bilhões disponibilizados pelo organismo. Desse total, cerca de US$ 58 bilhões foram, de fato, utilizados pelo governo brasileiro. Agora, o Brasil terá até 2007 para quitar a dívida de US$ 26 bilhões que ainda resta com o FMI. Ao anunciar os motivos que levaram o governo a decidir romper o período de sucessivos acordos com o FMI, Palocci disse que o Brasil tem dado "demonstrações inequívocas de que o esforço fiscal é um compromisso fundamental que não será negligenciado" e afirmou que a decisão de elevar ou não a meta em 2005 dependerá do desempenho da economia brasileira. "Vamos observar. Aumentamos no ano passado no ano passado pelas condições dadas pela evolução da economia brasileira e continuamos com forte compromisso fiscal". O importante, de acordo com o ministro, é fazer uma economia que permita reduzir o nível do endividamento público e dar sustentabilidade ao crescimento econômico que o País está vivendo. Em 2004, diante do crescimento econômico e do aumento das receitas, o governo decidiu elevar de 4,25% da produção nacional medida pelo Produto Interno Bruto (PIB) para 4,5% do PIB, a meta de superávit primário do ano. Com isso, freou a uma pressão por gastos mais elevados. O valor efetivamente atingido foi ainda maior: 4,61% do PIB. Se não houver nenhuma modificação, este ano, a meta voltará para o patamar anterior de 4,25% do PIB, o que gerou críticas de muitos analistas financeiros. Para eles, isso significa um aumento forte dos gastos que pressionará a demanda por bens e serviços num momento em que o Banco Central sobe juros para controlar a inflação. "Não estamos reduzindo o superávit em relação ao ano passado, mas mantendo o compromisso firmado desde 2003, quando consideramos que 4,25% que esse valor mantido por vários anos era suficiente para manter a trajetória de queda da dívida", argumentou. "No ano passado demos um aumento maior ao superávit dado o crescimento econômico e às receitas que vieram com esse crescimento", completou. Em fevereiro, o superávit primário do setor público atingiu 4,80% em 12 meses. Segundo Palocci, a melhora no perfil e no nível do endividamento público assim como o desempenho favorável de vários outros indicadores da economia foi o que deu à equipe econômica a certeza de que o Brasil já está preparado para caminhar sozinho, sem amparo financeiro do FMI. "Nossos indicadores são os melhores em 20 anos. Tivemos o maior crescimento em 10 anos, a produção industrial está no melhor nível em 18 anos. Todos esses indicadores têm se desenvolvido de maneira positiva e, por isso, resolvemos que não é necessário renovar com o FMI", disse. "Não é por nenhuma avaliação que não em cima dos fundamentos da economia brasileira". Nem mesmo a piora no cenário internacional, que gerou uma mudança de humor nos investidores e pode ter implicações nas economias emergentes que precisam atrair recursos externos, como o Brasil, foi tida como motivo suficiente para sustentar a tese de renovação do acordo. Segundo o ministro, as mudanças nas últimas semanas refletem o aumento dos juros nos EUA e do preço do petróleo no mercado internacional mas não deve durar muito. "Isso não nos traz preocupação adicional, na medida que são eventos que tendem a se equilibrar e, por outro lado, as condições da economia brasileira para enfrentar dificuldades externas hoje são muito maiores do que aquelas dos últimos 4 ou 5 períodos em que o Brasil concebeu acordo com o FMI". Mesmo como fim do acordo, o Brasil continuará discutindo com o Fundo, segundo o ministro, a criação de uma linha emergencial para socorrer países em momentos de crise. O governo brasileiro esperava contar com a aprovação dessa linha antes de definir sobre a renovação. Mas como o assunto ainda não é consenso dentro do organismo, ele continuará em debate. Palocci não descartou a possibilidade de o País vir a recorrer no futuro a novos programas com o FMI e disse que nesse período foi possível construir um bom relacionamento que deixará portas abertas ao País. "Nosso relacionamento com Fundo é bastante positivo." Esse arrazoado consta da Exposição de Motivos que Palocci encaminhou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No documento, ele acrescenta que a autonomia do Banco Central é "fundamental para a credibilidade da política monetária e para a atuação eficaz da instituição no combate às pressões inflacionárias". A autonomia do BC é um dos temas que Palocci discute hoje na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.