Título: Público, artigo raro nos museus
Autor: Carla Miranda
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2005, Cidades, p. C1

Mesmo instituições mais bem-sucedidas de SP, como Museu Paulista e Pinacoteca, têm visitação aquém da qualidade do acervo

O canto gregoriano toca baixinho, como para afastar o tumulto da Avenida Tiradentes, no centro. Nas paredes brancas do prédio, por si só uma obra de arte em taipa-de-pilão, anjos barrocos e altares dos séculos 17 e 18, recém-restaurados. Os passos dos monitores fazem eco no chão de madeira. Eles querem contar o que sabem, mas o Museu de Arte Sacra está vazio. Infelizmente, não é um caso isolado em São Paulo. Até o Museu Paulista (do Ipiranga) e a Pinacoteca - os únicos a passar a barreira dos 300 mil visitantes por ano numa cidade com mais de 10 milhões de pessoas - têm público inferior à qualidade dos acervos. A falta de hábito de freqüentar museus atrapalha, dizem diretores das instituições e especialistas, mas há outros problemas, entre eles falta de divulgação e de informação para o público.

Uma olhada de fora, na Tiradentes, mostra por que muitos conhecem a Igreja de Frei Galvão, oficialmente Nossa Senhora da Luz, mas não o acervo no mesmo prédio. O muro cobre metade da faixa indicativa do museu e, depois do portão, só placas discretas indicam a entrada. "Estes dias uma senhora disse que vem à igreja há 30 anos e nunca soube do museu", diz um funcionário.

A reportagem do Estado foi ao local duas vezes, na quarta-feira, dia 16, e no domingo passado. Não encontrou visitantes no museu mantido pela Igreja e pelo Estado. O público anual não passa de 20 mil pessoas, concentradas no Natal, para ver as mais de 1.600 peças do precioso Presépio Napolitano, doado por Ciccillo Matarazzo.

A secretária estadual da Cultura, Cláudia Costin, promete melhorias. "Além de novas placas, precisa de acesso para o outro lado da avenida, como uma passarela." A instituição está inscrita no projeto Monumenta, do governo federal, e espera verbas para as mudanças. A pasta de Cláudia tem R$ 4 milhões por ano para gastar com museus - como a Pinacoteca e o Museu da Imagem e do Som (MIS). Se o primeiro é considerado a estrela da secretaria, o MIS, tirando mostras de curtas e cinema, fica quase vazio. Recebe só 24 mil pessoas por ano.

O estudante Rodrigo Massi, de 19 anos, era um dos três visitantes do MIS na quinta, dia 17, às 16 horas. Andou para um lado, para o outro, sem ser abordado ou receber orientação. Rodrigo, que mora na zona norte, foi aos Jardins só para conhecer o MIS. "Gostei das fotos da África e sobre São Paulo. Só não tinha muitos dados sobre elas."

E a informação é um item básico para cativar o público. "A pessoa tem de compreender o que está vendo", diz a educadora de museus Adriana Mortara Almeida, que tem pós-doutorado na área. "Ou alguns museus se renovam ou vão morrer."

Fundadora do Museu Brasileiro de Escultura (MuBE), Marilisa Rathsam monta programações paralelas para atrair visitantes - hoje são cerca de 36 mil por ano. Há cursos de arte, recitais, feira de antiguidades. No domingo, havia bastante gente na feira, mas a Sala Burle Marx, a única com exposição, estava vazia. "Estamos preparando para os dez anos do museu uma mostra de Salvador Dalí, que deve ter público muito bom." O prédio na Avenida Europa já justifica a visitação. Obra do arquiteto Paulo Mendes da Rocha, ele foi projetado em vários níveis, com rampas e um belo espelho d'água.