Título: Impostos impedem o repasse da queda do dólar aos preços
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/03/2005, Economia, p. B1
O aumento da carga tributária impediu que a queda do dólar chegasse ao bolso do consumidor e ao custo das empresas. Estudo inédito da LCA Consultores mostra que a mudança na cobrança da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e do Programa de Integração Social (PIS), que passaram a incidir sobre as importações em 2004, anulou os possíveis efeitos que a valorização do real poderia ter no preço de matérias-primas e produtos comprados no exterior. Esse não foi o único resultado negativo do aumento da carga sobre o setor. Como a inflação não caiu no ritmo esperado, o Comitê de Política Monetária (Copom) apertou ainda mais a política de juros altos, prejudicando outra vez os brasileiros.
De acordo com a LCA, a tarifa média de importação praticamente dobrou com a introdução do PIS e da Cofins - saltou de 8% para 15,5%. O estudo ainda é preliminar, já que os cálculos foram feitos de forma simplificada. Para chegar às estimativas de tarifa média, a consultoria utilizou dados da Receita Federal referentes à arrecadação mensal de tributos incidentes sobre produtos importados - o Imposto sobre Importação, o Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) e a Cofins.
"Esse aumento representou um tremendo choque de custos para as empresas que importam matérias-primas e componentes", afirma o economista Bráulio Lima Borges, responsável pelo estudo da LCA. "Trata-se de um fator que reduz de forma relevante a ajuda que o Banco Central poderia contar com a apreciação cambial sobre a inflação".
O presidente da Associação Brasileira dos Consultores Tributários, Waldir Luiz Braga, concorda. "A carga tributária é extremamente relevante na formação de preços". Braga acrescenta que o aumento da carga sobre as importações não se restringiu apenas à cobrança do PIS e da Cofins (alíquotas de 1,65% e 7,6%, respectivamente). Este ano, as empresas passaram a ser obrigadas a recolher cerca de 5% a título de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) prestados fora do País.
Entre junho de 2004 e o mês passado, a cotação média mensal do dólar caiu 17%, de R$ 3,13 para R$ 2,60, mas reagiu para R$ 2,70 nas primeiras semanas de março. Nem assim, a inflação recuou no ritmo esperado pelo governo. Nos últimos 7 meses, o Copom elevou sistematicamente a taxa básica de juros (Selic), de 16% para 19,25% ao ano, na tentativa de fazer as projeções de inflação convergirem para a meta de 5,1%. Hoje, o mercado trabalha com a expectativa de alta de 5,8% para a inflação em 2005.
"O mercado financeiro está criando um sentimento de que a Selic vai subir ainda mais", observa o presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), Cláudio Vaz. "Na nossa avaliação, os juros nos níveis em que estão já representam uma extorsão institucionalizada".
Para o economista da LCA, o dólar precisaria cair para perto de R$ 2,50 e permanecer nesse nível por muito tempo para poder influir na queda da inflação. O problema é que isso seria bastante prejudicial às exportações, já que a taxa de câmbio de equilíbrio hoje seria em torno de R$ 2,90. Além disso, nem toda desvalorização do dólar é repassada aos preços. Em alguns casos, as empresas aproveitam para recompor margens de lucro."Boa parte das oscilações do câmbio é diluída na base de produção", diz Sérgio Loeb, presidente da Semp Toshiba SA. Ele observa que não é o dólar que determina o preço de componentes. "Como são poucas as empresas fornecedoras, temos uma inflação de demanda toda vez que o mercado é comprador, como acontece atualmente".