Título: Para analistas, moeda já está perto de R$ 2,50
Autor: João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/02/2005, Economia, p. B4

Queda pode ser sucedida por forte ajuste e não há muito o que o BC possa fazer

LONDRES - Para analistas da City londrina, o Banco Central (BC) está em uma situação delicada em relação ao câmbio. Segundo eles, vários fatores apontam que é cada vez mais plausível a hipótese de a cotação do dólar no Brasil atingir os R$ 2,50. Os exportadores estão agilizando a conversão de dólares em reais, com medo de que a moeda americana caia ainda mais. Como disse o diretor de uma filial de um banco brasileiro na Europa, os fluxos viraram uma avenida de "uma mão só", com as empresas atrasando remessas ao exterior, inclusive pagamento de dividendos, para aproveitar a valorização do real e o alto retorno propiciado pelos juros internos. De olho nessa tendência, capitais de caráter mais especulativo, em busca de yields mais graúdos, estão sendo injetados no Brasil por investidores locais e estrangeiros.

A preocupação é de que esta trajetória, estimulada por capitais de curto prazo, traga volatilidade quando o cenário externo for revertido. "Como os yields nos Estados Unidos continuam fracos, estamos vendo na América Latina um forte movimento de demanda de ativos, inclusive com a presença de fundos hedge, que pode criar turbulências no futuro", disse o economista Henry Stipp, do fundo de investimentos Threadneedle. "No caso do real, o risco é de que um overshooting seja sucedido por um ajuste muito forte."

Para o diretor da corretora hedge Liabilities Solutions, Wilber Colmerauer, não é exagero falar em uma bolha. "A moeda está supervalorizada e não duvido que possa chegar nos R$ 2,50", disse. "Há pouco que o BC possa fazer, pois há uma combinação de fluxo de exportações, juros altos do mercado interno e aposta de capital especulativo de curto prazo."

Colmerauer afirma que, no geral, os fundos hedge não estão jogando mais recursos no País: "Ao contrário, os fundos hedge com os quais converso regularmente estão surpresos com o que está acontecendo no Brasil e começam a procurar proteção, pois os ganhos recentes com o País foram enormes e eles acham que o limite está próximo". Mas, segundo ele, tem muito capital de curto prazo, dedo no gatilho, inclusive doméstico, aproveitando "esta que pode ser a última raspa do tacho nos retornos". Para o analista, quando houver a reversão desta tendência, o ajuste pode ter alguma magnitude. "Dependendo de como ocorrer, pode vir a doer."

EXPORTAÇÕES EM RISCO

O jornal Financial Times afirmou ontem que a alta do real está sendo vista como uma ameaça às exportações brasileiras. Segundo o diário britânico, pela primeira vez em muitos anos, os brasileiros de classe média estão tirando férias no exterior e comprando vinhos importados, e não nacionais. Nesta semana, o real atingiu R$ 2,60 diante do dólar, uma valorização de 19% desde maio e seu nível mais forte dos últimos três anos.

"Após uma crise cambial que levou o País à beira do colapso financeiro há pouco mais de dois anos, uma moeda forte e a entrada de fluxos de moeda estrangeira deveriam ser notícias excelentes", disse o FT. "Mas os críticos afirmam que a recuperação do real está colocando em risco uma bonança de exportações que já dura dois anos, além de ameaçar as contas externas equilibradas."