Título: Presidente quer PMDB de vice na eleição de 2006
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/03/2005, Nacional, p. A4

Dirceu e Genoino são chamados para montar palanques nos Estados, mesmo que PT seja sacrificado em candidaturas próprias

BRASÍLIA-Antes de desligar os holofotes da agonizante reforma ministerial, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu ao chefe da Casa Civil, José Dirceu, uma tarefa espinhosa: organizar o palanque de alianças para o projeto da reeleição, em 2006. Lula quer casar de papel passado com o PMDB e oferecer ao partido a vaga de vice em sua chapa, desde que os peemedebistas marchem unidos em torno de sua candidatura ao segundo mandato. A missão é quase impossível. Na prática, trata-se de movimento inverso ao que foi feito pela então prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT), que rejeitou a dobradinha com o PMDB. Marta perdeu a eleição e agora quer concorrer à sucessão do governador Geraldo Alckmin (PSDB), para desespero do Planalto, que torce para emplacar a candidatura do líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP).

O presidente do PT, José Genoino, foi escalado por Lula para ajudar Dirceu na missão 2006 e, principalmente, para "tourear" o partido. Motivo: se depender de Lula, o PT não terá candidato próprio ao governo de vários Estados, para facilitar a montagem da aliança nacional - ordem comparável a mexer num vespeiro.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, Lula quer que o PT apóie a reeleição do governador Germano Rigotto (PMDB), mesmo se tiver de sacrificar a candidatura do petista Olívio Dutra, hoje ministro das Cidades. "Não vamos ligar os motores de 2006 em 2005", desconversa Genoino. "Estamos abertos a discutir tudo, mas não ter candidato no Rio Grande do Sul é uma coisa muito difícil."

ECONOMIA

Apesar das negativas oficiais, os ministros do PT e a cúpula do partido estão, sim, preocupados com o projeto da reeleição de Lula. Diante do aumento da taxa de desemprego registrada na semana passada, o ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, foi taxativo: disse que taxas de juros altas, em qualquer país do mundo, prejudicam o mercado de trabalho.

"Oitenta por cento do humor político do País decorre da situação da economia, especialmente da geração de empregos. Então, é preciso combinar como atingir metas de inflação e metas sociais", afirma Berzoini, um dos sobreviventes petistas da reforma.

Para ajudar Lula a conseguir um segundo mandato, o PT também jura de pé junto que não vai reivindicar mais espaço no governo nem jogar torpedos contra o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, do PC do B. Poucos acreditam.

"Reforma ministerial é um assunto encerrado", repete Genoino, parafraseando o presidente. "O PT, enquanto instituição, não cria dificuldades para o presidente. Eu sempre defendi o governo de coalizão." Genoino realmente defende, mas, no partido, há um descontentamento amplo, geral e irrestrito com os rumos da gestão Lula.

Dos radicais aos moderados, a insatisfação atinge todas as facções de militantes. Com manifestações barulhentas e abaixo-assinados, eles conseguiram segurar Olívio em Cidades e Humberto Costa no Ministério da Saúde. Para compensar, não perderam a compostura nem chiaram publicamente quando Romero Jucá (PMDB-RR), ex-líder do governo Fernando Henrique no Senado, foi guindado ao Ministério da Previdência, substituindo o também senador peemedebista Amir Lando (RO).

A ala "esquerda" do PT chegou a torcer o nariz para a indicação do deputado petista Paulo Bernardo (PR) no Planejamento porque ele representa a vitória do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, sobre Dirceu. Mas, apesar do lobby a favor do deputado Jorge Bittar (PT-RJ), engoliu Bernardo, considerado boa praça.

MAL-ESTAR

Dirceu foi surpreendido com a suspensão da reforma e ficou desolado. Disse que saiu mal do processo, pois vinha negociando cargos no governo com o PP e o PMDB em nome de Lula. Disciplinado, reclamou que pela segunda vez não tinha como se justificar diante dos dirigentes peemedebistas.

A primeira desfeita foi depois da eleição de Lula, em 2002, quando Dirceu acertou com a cúpula do PMDB que o partido comandaria Comunicações e Minas e Energia. Tudo pronto, titulares escolhidos e Lula resolveu mudar tudo. Resultado: na primeira escalação, Lula deixou o PMDB fora do governo.

O presidente percebeu o mal-estar e, na reunião ministerial de quarta-feira, dirigiu um afago ao chefe da Casa Civil. Além disso, Dirceu terá muito o que fazer daqui para frente, na tentativa de reconstruir pontes com os aliados e tendo 2006 no horizonte.

Nesse cenário de segundo tempo, o governo também não acredita em revanche insuflada por bancadas de "ministros" que foram sem nunca terem sido. É que, com exceção da Medida Provisória 232 aumentando impostos dos prestadores de serviço, o Planalto não tem agenda significativa para votar no Congresso. Mesmo assim, ninguém tem dúvida de que Lula voltará a negociar com a base, mas do seu jeito. Se vai funcionar ou não, é cedo para saber. "Cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém", contemporiza o presidente sempre que a pressa bate à porta do Planalto.