Título: Comércio e pirataria
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/04/2005, Notas e Informações, p. A3

O governo americano decidiu prorrogar por seis meses, isto é, até setembro, o prazo dado ao Brasil para comprovar atuação eficaz no combate à venda de produtos falsificados e ao crime contra a propriedade intelectual.

Com essa decisão, exportadores brasileiros continuarão beneficiados pelo Sistema Geral de Preferências (SGP), que permite o ingresso de certo número de produtos nos Estados Unidos com tarifa zero. No ano passado, mercadorias no valor de US$ 2,1 bilhões, cerca de 10% das vendas ao mercado americano, foram exportadas sob esse regime. As concessões proporcionadas pelo SGP são voluntárias e unilaterais. A ameaça de exclusão do Brasil permanece e em tese poderá ser aplicada, dentro de alguns meses, se a proteção da propriedade intelectual no Brasil for considerada insuficiente.

O alongamento do prazo é ¿resultado de alguns passos iniciais positivos do governo brasileiro¿, segundo o Escritório do Representante dos Estados Unidos para o Comércio (USTR), equivalente a um Ministério do Comércio Exterior. O ministro interino, Peter Allgeier, havia conversado poucos dias antes com o subsecretário de Assuntos Econômicos do Itamaraty, Clodoaldo Hugueney, sobre as ações do governo brasileiro.

Pela avaliação do USTR, no entanto, os processos e condenações continuam pouco numerosos e insuficientes para desestimular o crime.

Em setembro do ano passado o governo americano havia dado 180 dias para o Brasil iniciar uma ofensiva mais séria contra a pirataria. A pressão aumentou recentemente, quando a International Intellectual Property, uma das principais organizações de propriedade intelectual do mundo, denunciou o governo brasileiro à Casa Branca por não ter implementado as propostas da CPI da Pirataria e pelos resultados insignificantes da repressão ao contrabando.

A entidade cobrou das autoridades americanas a punição do Brasil, argumentando que as empresas americanas perderam US$ 758 milhões, em 2003, em conseqüência da invasão de produtos pirateados. Em março, o presidente do Subcomitê do Senado para o Hemisfério Ocidental, senador Norm Coleman, esteve no Brasil para discutir o assunto.

As autoridades brasileiras devem combater a pirataria não só para atender às pressões de outros países, mas principalmente porque o País é gravemente lesado pelo contrabando e pelas falsificações e porque há conexões entre essas práticas e o grande crime organizado.

O Comitê Interministerial de Combate à Pirataria, criado em 2001, teve desempenho frustrante, dando a impressão de ter surgido apenas para atenuar as críticas ao País. Em novembro de 2004, a Delegacia da Receita em Foz do Iguaçu intensificou o cerco ao contrabando. Pouco antes do vencimento do prazo determinado em setembro pelo USTR, o governo federal criou o novo conselho que, nos últimos dois dias de fevereiro, traçou um plano de combate à pirataria, composto de 99 normas, muitas capazes de trazer resultados de curto prazo.

Agora, com a união das polícias, da indústria e das autoridades superiores, operações como as da Delegacia da Receita em Foz do Iguaçu, iniciadas em novembro de 2004, podem trazer resultados maiores. No ano passado, o valor das apreensões de mercadorias contrabandeadas na fronteira com o Paraguai chegou a US$ 33,574 milhões. Foi um recorde e quase o dobro das apreensões de 2003.

A repressão ao contrabando, agora definida pelo Plano Nacional de Combate à Pirataria, terá duração prolongada e reunirá Polícia Federal, Receita Federal, Conselho de Combate à Pirataria e Ministério da Justiça. Segundo as autoridades, ações como as desenvolvidas na fronteira com o Paraguai se estenderão a outras portas de entrada do contrabando, como os Portos de Santos e Paranaguá, as cidades gêmeas de Ponta Porã e Pedro Juan Caballero e a fronteira do Uruguai, na região do Arroio Chuí.

Segundo o Itamaraty, o governo americano teria tomado uma decisão mais adequada se abandonasse a ameaça de excluir o Brasil do SGP. O País, segundo as autoridades de Brasília, está e continuará empenhado no combate à pirataria. Mas é inegável que os resultados ainda são limitados e que é preciso fazer muito mais para desencorajar os contrabandistas e falsificadores.