Título: Onde estávamos, havia olheiros, lembra Erundina
Autor: Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/02/2005, Nacional, p. A10

RIO - Impedida pela ditadura de trabalhar na Universidade Federal da Paraíba, no início dos anos 70, a assistente social Luiza Erundina voltou para São Paulo, onde tinha feito o mestrado, e intensificou a militância sindical que reunia várias categorias de profissionais liberais. Funcionária concursada da Secretaria da Família e Bem-Estar paulistana, ela estava na linha de frente de movimentos pelo direito à moradia e, no fim da década, das primeiras greves. "Onde nós estávamos, havia olheiros", diz Erundina, hoje deputada federal do PSB e ex-prefeita de São Paulo, eleita em 1989 pelo PT. Erundina foi uma das "infiltradas comunistas" apontadas pelo serviço de informação do governo em janeiro de 1983.

ENTULHO AUTORITÁRIO

"As greves de 1978 e 1979, embora lideradas pelos trabalhadores da produção, como os metalúrgicos, tinham forte presença de profissionais liberais. Era uma ação conjunta e a greve não era por bandeiras econômicas, mas sim políticas", conta ela. "Na secretaria onde eu trabalhava, havia um grupo muito combativo e nós éramos vistos com muita desconfiança. O chamado entulho autoritário estava em plena vigência. A ditadura estava corroída por dentro, eles estavam enfraquecidos."

Erundina não conhecia o documento sobre a "infiltração" comunista na administração paulistana, mas sabe que suas ações eram investigadas nos anos 70 e início dos 80. Em 1979, lembra ela, durante um congresso nacional de assistentes sociais, de caráter oficial, com comissão de honra formada pelo então presidente João Baptista Figueiredo, pelo governador paulista, Paulo Maluf, e outras autoridades, um grupo de profissionais realizou uma assembléia paralela, destituiu a comissão de honra e tomou a direção do congresso.

Assumiram a comissão de honra o sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva e integrantes dos movimentos contra a carestia e pela anistia. "Tudo isso deu pretexto para que eles nos vissem como infiltrados. Imagino que meu nome esteja por aí nesses documentos", afirma a deputada.