Título: Líderes de cinco países latinos estarão ausentes
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/04/2005, Especial, p. H1

São eles Argentina, Uruguai, Chile, Colômbia e Cuba. Kirchner não explicou

sua ausência, mas são conhecidos os conflitos entre seu governo e o Vaticano BUENOS AIRES-Entre os poucos chefes de Estado que estarão ausentes dos funerais do papa João Paulo II há os de cinco países latino-americanos: Argentina, Uruguai, Chile, Colômbia e Cuba. Nos últimos anos, o presidente da Argentina, Néstor Kirchner, entrou várias vezes em conflito com o Vaticano e, para deixar mais clara sua distância com o papa, não foi à missa realizada em memória de João Paulo II na catedral portenha. Kirchner não explicou o motivo de sua ausência nos funerais. Disse apenas que estará em Roma para a posse do novo representante máximo da Igreja. Sabe-se que, na quinta-feira, ele participará de cerimônia com o Ministro da Saúde, Ginés González García. Na sexta-feira, dia do enterro, vai celebrar os cem anos de Esteban Echeverría, cidade de pouca relevância na Grande Buenos Aires.

Hilda Chiche de Duhalde, uma das principais líderes do Partido Justicialista (Peronista) e mulher do ex-presidente Eduardo Duhalde, criticou Kirchner. Segundo Hilda, que tem uma filha freira, a Argentina deve muito a João Paulo II por sua intensa ação para impedir a guerra entre o país e o Chile, em 1978, pela disputa do Canal de Beagle.

O vice-presidente Daniel Scioli, que vai a Roma no lugar de Kirchner, explicou que a Argentina levará "a máxima representação possível". Segundo Scioli, a ausência do presidente "não possui outra leitura, pois existe um sentimento profundo" de Kirchner em relação à morte do papa.

Desde que tomou posse, em maio de 2003, o presidente teve vários conflitos com o Vaticano. O primeiro ocorreu quando designou a juíza Argibay Molina, levemente favorável ao aborto, para a Corte Suprema de Justiça. A Igreja se escandalizou e pediu que a indicação fosse reconsiderada.

O aborto foi também o pivô do último confronto, há dois meses, quando o capelão-geral das Forças Armadas, bispo Antonio Baseotto, se irritou com o ministro García, que defendia a interrupção da gravidez em caso de estupro. Baseotto disse que alguém deveria amarrar uma pedra no pescoço de García e jogá-lo ao mar.

O governo pediu ao Vaticano que o capelão fosse retirado da função, algo que a Igreja não aceitou. Diante do impasse, o presidente demitiu Baseotto, que recebia US$ 1.785 mensais na categoria de Secretário de Estado. O Vaticano reagiu, acusando Kirchner de restringir a liberdade religiosa.

Em Buenos Aires, especialistas acreditam que o governo tem agora a chance de começar com o pé direito uma relação com o próximo papa. Outra vantagem seria a saída do cardeal Angelo Sodano da Secretaria de Estado da Santa Sé. Kirchner e o cardeal travaram confronto direto por causa da juíza, do capelão e da posição da Argentina, favorável ao casamento homossexual e à clonagem com fins terapêuticos.

Fidel Castro, que tinha pensando em ir a Roma, agora não confirma a presença. A delegação cubana será liderada pelo presidente do Parlamento, Ricardo Alarcón.

O presidente Alvaro Uribe, da Colômbia, viaja pela Ásia. Ricardo Lagos, do Chile, informou que ficará em Santiago por causa do grave estado de saúde de sua mãe. Tabaré Vázquez, o recém-empossado presidente esquerdista do Uruguai, não vai a Roma porque seu país rompeu com a Igreja há 85 anos.