Título: Os assassinos de irmã Dorothy
Autor: Leonel Rocha
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/03/2005, Nacional, p. A16

No mês passado, no Estado do Pará, no Brasil, pistoleiros pararam uma americana na estrada e a mataram. De acordo com seus companheiros, a freira, Dorothy Stang, leu a Bíblia para seus matadores antes de ser assassinada. Irmã Dorothy, nascida em Ohio mas naturalizada brasileira, tinha sido uma defensora dos trabalhadores rurais desde os anos 70, ajudando camponeses a sustentar-se com pequenas glebas e extraindo produtos da floresta, sem danificá-la. Ela esforçou-se também por protegê-los das gangues de criminosos interessados naquelas terras.

O assassinato público de uma freira americana não é apenas um crime horrível - é um aviso. Os grileiros estão dizendo ao governo que quem manda no Pará são eles. O governo brasileiro reagiu com vigor, mas resta saber se ele é suficientemente forte para mostrar aos grileiros que eles estão errados.

A violência não é nova no Pará, mas aumentou porque um trecho de uma rodovia está para ser asfaltado, para criar um caminho permanente para escoar os produtos para outros mercados. O valor da terra subitamente explodiu, e grileiros estão matando camponeses e queimando suas casas para tomar-lhes as propriedades. Eles cortam árvores para vender a madeira e repassam as áreas abertas para fazendas de gado e soja.

Desde a morte de irmã Dorothy, o governo mandou 2.000 soldados para manter a ordem no Pará, anunciou a proibição de comercialização da madeira numa área de 8,3 milhões de hectares ao longo da nova rodovia e criou mais duas áreas de proteção florestal sob controle federal. O desafio é fazer essas medidas serem obedecidas e mantidas.

As tropas adicionais não deveriam ser apenas uma medida temporária, mas o início de uma implantação da lei. Garantir a proteção das florestas será difícil porque os madeireiros têm agido à vontade, há muito tempo. É também dramaticamente importante definir com clareza os títulos de terras.

Por fim, cabe ao governo punir os matadores de líderes rurais, como irmã Dorothy. A organização religiosa à qual ela pertencia informa que aproximadamente mil ativistas rurais foram mortos de 1985 a 1996; no ano passado, apenas cinco pessoas foram presas por causa dessas mortes. Desde o assassinato de irmã Dorothy, pelo menos outros quatro líderes rurais foram executados. O governo esquerdista do Brasil parece ansioso por fazer da morte de irmã Dorothy um fermento de mudança, mas precisa, para isso, resistir a forças que, até agora, mostraram-se sempre mais fortes que a lei.