Título: Rombo da Varig é de quase R$ 10 bi
Autor: Celso Ming
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/04/2005, Economia, p. B1

Documento interno revela que o passivo da companhia aérea cresceu 39% em 2004 e já atingia R$ 9,472 bilhões em 31 de dezembro

A situação financeira e patrimonial da Varig é bem pior do que se imaginava. Documento "confidencial" intitulado "Reestruturação da Varig", ao qual o Estado teve acesso, mostra que o passivo total já atingia R$ 9,472 bilhões em 31 de dezembro. O número representa um crescimento de 39% no passivo em relação a 2003. O documento trata apenas do passivo da empresa, com valores que diferem dos que constam nos balanços enviados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No terceiro trimestre do ano passado, último balanço disponível, o passivo era de R$ 6,6 bilhões e vinha em ligeira queda. No trimestre anterior, era R$ 260 milhões maior.

Caso o plano de reestruturação que está sendo elaborado pelo Unibanco, em conjunto com o Wald Advogados e a Trevisan Consultoria, seja levado adiante, haverá mais uma conta de R$ 500 milhões com rescisões e passivos trabalhistas, conforme o documento. O plano prevê demissão de todos os 11,5 mil funcionários e a recontratação de parte deles numa nova Varig, que ficaria blindada de todo o passivo.

Apesar da magnitude dos valores, ainda assim eles parecem não dizer tudo. O texto abre com uma "Nota de Ressalva" em que Unibanco, Wald Advogados e Trevisan advertem que não se responsabilizam nem pela exatidão nem pela veracidade dos números elaborados "com base e como resultado de informações fornecidas pelos administradores do Grupo Varig e fontes públicas, sem qualquer verificação independente".

Diz, ainda, o documento: "Nem o Unibanco, nem o Wald, nem a Trevisan, nem seus diretores, empregados, prepostos, assessores, agentes ou representantes garantem a exatidão ou integridade do material ora apresentado". Completam a ressalva afirmando que os três contratados "não fazem ou farão qualquer (sic) declaração quanto à exatidão ou viabilidade de tais avaliações, estimativas e/ou projeções". Com isso, sugerem a existência de "esqueletos", o principal fator que explica o salto do passivo em 2004.

Esses valores mostram que o encontro de contas entre créditos e dívidas que as empresas aéreas negociam com o governo pode estar longe de reequilibrar as finanças da empresa. Em dezembro, a Varig ganhou na Justiça o direito de receber cerca de R$ 2,5 bilhões da União a título de indenização pelos prejuízos com sucessivos planos econômicos.

De acordo com o documento, o item da dívida que mais cresceu foi o "Outros da União Federal": 1.100% (dez vezes). Também impressiona o déficit atuarial da Aerus, o fundo de pensão dos funcionários patrocinado pela Varig, que saltou 73,7% de R$ 673 milhões para R$ 1,17 bilhão.

A Varig deixou, também, de recolher sua parte em contribuições ao Aerus, de R$ 1 bilhão. Além disso, há o já mencionado déficit atuarial, também de sua responsabilidade. Isso significa que o Aerus aparece com um rombo total de R$ 2,2 bilhões. No consolidado estatístico de novembro da Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), o Aerus apresentava investimentos (patrimônio) de R$ 1,3 bilhão.

O porta-voz da Varig, João Zacharias, afirma que, oficialmente, a empresa desconhece a existência do documento, que tem a chancela do Unibanco, do Wald e da Trevisan Consultoria. Diz, ainda, que não comenta os números nele contidos nem sua eventual atualização porque o balanço de 31 de dezembro de 2004 ainda não foi encaminhado à CVM.