Título: O 'mercado' e o Copom
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/02/2005, Economia, p. B2

As autoridades monetárias estão dando excessiva atenção às chamadas expectativas do "mercado" sobre a evolução da inflação e da taxa Selic. Nas atas do Comitê de Política Monetária (Copom) sempre aparece a informação de que o mercado está prevendo uma inflação acima da meta, como que para justificar um novo aumento da Selic. O que se chama ali de "mercado" é, na realidade, um grupo de bancos que nem sempre têm uma equipe de analistas econômicos apta o bastante para fazer uma previsão da evolução da inflação. Mas o mais grave é que os bancos são os maiores interessados numa taxa de juros básica elevada, sobre a qual acrescentam um "spread" também elevado. Assim, as decisões do Copom se baseiam, de um lado, numa meta de inflação que não leva em conta os choques externos (por exemplo, a alta do preço do petróleo) e, de outro, em expectativas de bancos interessados em elevar a Selic.

O relatório do mercado, divulgado ontem pelo Banco Central (BC), mostra que as instituições financeiras estão prevendo agora um IPCA de 5,74% para este ano, ante 5,7% apenas um mês atrás; e uma taxa Selic, para o fim do ano, de 16,78% e uma média anual de 18,3%, quando há um mês as expectativas eram respectivamente de 16% e 17,44%. Acresce que, neste momento, 43 bancos, entre 46, consideram que, na quarta-feira, as autoridades monetárias aumentarão em 0,5 ponto porcentual a taxa Selic, que passaria a ser de 18,75%.

Ou seja, o mínimo que se pode concluir é que as instituições financeiras estão fornecendo ao BC uma justificativa antecipada para apertar ainda mais a política monetária, embora o "mercado" continue prevendo, para o final do ano, uma cotação cambial de R$ 2,76 por dólar, com uma tendência de redução que deveria ser acompanhada pela inflação. Além disso, os novos índices de inflação sinalizam uma trajetória favorável dos preços, embora ainda acima da meta fixada pelo Conselho Monetário Nacional, de 5,1%.

Os bancos estão, desse modo, sendo cúmplices do Copom na manutenção de uma taxa de juros elevada e não estão dando sinais de transferir para o "spread" os efeitos positivos da nova Lei de Falências e da redução dos índices de inadimplência.

O risco que se corre é que o custo do crédito afete, além dos investimentos, a demanda interna e as exportações. Assim, justifica-se uma ampla discussão da política de metas para conter a inflação, ainda que ela seja muito alta.