Título: Estrada foi o estopim da Guerra do Contestado
Autor: Daniel Hessel Teich
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/03/2005, Economia, p. B9

Posseiros e fanáticos religiosos unidos contra o governo e colonos que compraram terras da empresa CAÇADOR, SC - A abertura da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande foi a principal causa da Guerra do Contestado, uma disputa que envolveu posseiros e fanáticos religiosos contra o governo e colonos que compravam terras vendidas pela empresa Southern Brazil Lumber & Colonization Company. A crise foi tão grave que a empresa de Percival Farquhar foi obrigada a paralisar o processo de colonização. O conflito, que durou quatro anos, de 1912 a 1916, resultou em mais de 10 mil mortes, a grande maioria revoltosos massacrados pelo Exército. No combates, foram utilizados pela primeira vez aviões para bombardeios aéreos dos vilarejos e acampamentos rebeldes, em 1915.

Na sede da Lumber, em Três Barras, milícias armadas se alojavam em trincheiras para repelir qualquer rebelde que ousasse se aproximar. Eles tinham receio de ataques como o da cidade de Calmon, em que a serraria e todo o povoado foram incendiados, depois da população, tomada de surpresa, ter sido massacrada pelos revoltosos.

"A situação já era confusa com a disputa territorial entre Paraná e Santa Catarina, em que ambos contestavam os limites dos seus territórios. Daí a origem do nome Contestado dado à região", explica o autor de Trem de Ferro, Nilson Thomé, que também dirige o Museu do Contestado, em Caçador. "Com a chegada da ferrovia, o equilíbrio que já era precário deixou de existir."

Entre os milhares de revoltosos, segundo Thomé, estavam antigos trabalhadores da construção da ferrovia. "Farquhar só acertou o assentamento dos trabalhadores estrangeiros, muitas vezes como termo de um contrato de imigração. Aos brasileiros restava voltar para suas regiões de origem ou viravam posseiros."

Muitos se tornaram seguidores de dois pregadores fanáticos, num movimento contestatório monarquista e de inspiração messiânica. Em pouco tempo passaram a brigar pelas terras de onde haviam sido expulsos. O Exército interveio, em princípio de forma desorganizada, mas depois de várias derrotas para os jagunços enviou um efetivo de 7 mil homens para a região, o equivalente a 60% do total do efetivo militar do País.

Os revoltosos foram massacrados em 1915 e em 1916. Paraná e Santa Catarina resolveram a questão dos limites e, em 1917, a Lumber retomou suas atividades com todo o vigor.