Título: Debate sobre aborto pode excluir igrejas
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Fonte: O Estado de São Paulo, 19/02/2005, Vida, p. A20

Conselho da Mulher, dominado por feministas, não quer religiosos em comissão.

A comissão tripartite que vai debater mudanças na legislação que pune o aborto pode deixar as igrejas de fora do debate. O governo sugeriu ao Conselho Nacional dos Direitos da Mulher um convite ao Conselho Nacional das Igrejas Cristãs (Conic), que reúne as principais congregações religiosas do País, incluindo as Igrejas Católica, Anglicana e as evangélicas, entre outras. Mas o conselho, formado na sua maioria por organizações feministas, não quer nem ouvir falar na possibilidade. A comissão será formada por seis representantes do governo, seis do Congresso e seis da sociedade civil. Cabe ao Conselho definir os nomes da sociedade civil, e é aí que o debate emperrou. Cinco já foram definidos: quatro de grupos feministas e um da Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (Febraso). "Queremos reservar espaço para organizações que não sejam ligadas diretamente aos direitos da mulher", explicou a secretária nacional de Políticas para Mulheres, Nilcéa Freire. Daí convidar as igrejas.

No entanto, a própria ministra admite que a idéia enfrenta resistência. As posições das igrejas cristãs são conhecidas, mesmo que com algumas diferenças entre elas. Todas são contrárias ao aborto, em especial católicos e evangélicos. "O máximo a que algumas delas chegam é acrescentar uma outra possibilidade às já existentes em lei, como a do caso dos bebês anencéfalos", diz o pastor Ervino Schmidt, secretário-executivo do Conic. Hoje a lei brasileira só autoriza o aborto em casos de estupro ou risco de vida para a mãe.

Schuma Schumaher, da Articulação de Mulheres Brasileiras, uma das organizações que farão parte da comissão, admite ouvir a igreja, mas não quer que ela faça parta de comissão. "O Estado é laico. Essa é uma das determinações da Constituição brasileira. Não vamos debater uma questão moral, mas uma mudança que garanta a autonomia da mulher."

Apesar de estar em campo oposto, o secretário-executivo do Conic também cita o Estado laico como um entrave para a participação das igrejas. "É uma posição pessoal, mas acredito que, dada a separação entre Estado e Igreja, o Estado deve legislar", disse o pastor. Mas essa não é a posição da Igreja Católica.